Frustrações de uma Sexta-Feira 13
Por milênio nós adormecemos. Nossas histórias ressoavam no ar. Era uma época que as pessoas se benziam e rezavam com medo de nós. Lembro daqueles velhos precavidos que sempre carregavam uma cruz de prata para se defender. Eram bons tempos...
Acontece que ontem eu teimei em acordar. Sexta-Feira 13 sabe? Lua cheia... Tem um apelo que não se pode negar né? Pois é... Ontem eu finalmente resolvi sair de novo, depois de mil anos! Para quê? O mundo de hoje não dorme de noite mais! A lua estava indicando meia noite e as ruas da cidade estavam lotadas ainda! Nós somos como um grupo de hienas. Esperamos o fraco sair de perto do bando e abatemos. Mas com tanta gente assim... E vou te contar. Eita cidade grande! Do meu caixão até onde eu tava percorri muitas léguas. Cheguei a me perder. Sem falar nas luzes! É luz pra tudo quanto é canto! Parece de dia! Até onde não tem luz fica iluminado! E eu achando que era a lua... Era o reflexo da luz da cidade nas nuvens! Não tinha onde eu me esconder para aparecer das sombras.
Antigamente era muito bom. Você via aquela mulher andando sozinha apavorada no meio da noite. Saia do escuro com aquele olhar assustador. Era só mostrar os dentes e ela paralisava de medo e gritava! Eu adorava os gritos! Ontem?! Ontem eu saí do beco escuro, o quão escuro que consegui achar, abri a capa mostrei meus dentes e meus olhos vermelhos. A mulher riu de mim! E continuou andando. Então eu virei fumaça e apareci na frente dela e a agarrei. Ai eu perguntei: “Você sabe o que sou eu?” e ela respondeu de pronto: “Um emo!”. Eu tenho vergonha de dizer... Mas... Eu não consegui. Pela primeira vez na minha vida aconteceu isso comigo. “Eu sou um vampiro e vou chupar seu sangue!” e ela disse: “Vai fundo, vamos... to esperando...” e eu não consegui. Larguei-a e ela foi embora me zombando: “Emo de merda...”
Fiquei deprimido. Fui procurar uma taberna... Achei só um buraco no chão que as pessoas entravam. Eu nem sei como conseguiam pedir alguma bebida, o som era tão alto que eu nem sabia onde eu tava. Se virasse morcego ali, estaria cego... O que não faria muita diferença, porque as luzes piscando sem parar também não me deixavam ver porra nenhuma. Finalmente consegui me sentar: “Vinho” e me disseram: “Aqui está emo”. Que diabos de é emo? É como chamam os vampiros hoje em dia? Mais tarde descobri que era um grupo de pessoas que se vestiam igual e se reuniam para chorar... Outros falavam que era homossexual, eu não sei... Bem... A fome voltou e queria sangue. Aproveitei o ritmo caleidoscópico do local e fui atacar uma mulher que estava no canto.
Quando fui mordê-la ela perguntou: “O que você ta fazendo?” e eu respondi: “Vou chupar seu sangue!”. Ela ficou toda animada: “Ah! Chupa mesmo!” e me ofereceu o pescoço. Estranhei muito e perguntei: “Você sabe que você vai morrer né?” e ela respondeu: “Que morrer nada, você não é vampiro?”. “Sou” respondi. “Então! Você chupa meu sangue e a gente começa a namorar!”. “Não é bem assim que funciona... Você morre e depois levanta como vampiro.”. “Ai a gente começa a namorar?”. Ela tava dando em cima de mim... Eu não acreditei... “Não! Um grupo de homens destemidos vai até o seu caixão e tentam te matar!”. “Mas... por que eles tentam me matar?” ela perguntou confusa. “Porque você vai virar uma criatura da noite, um ser medonho e pavoroso que sai da sua jazida para se alimentar dos vivos! Uma criatura amaldiçoada! Um ser infernal!”. Depois de um minuto dela processando aquilo ela pergunta: “Mas vampiros não brilham no sol?”. Eu fiquei pasmo! “Não! Os vampiros morrem no sol! A gente não é feito de purpurina!”. “Mas eu li...”. “Não importa o que você leu! Vampiros não são pessoas boazinhas que querem ser teu namoradinho! Somos criaturas vis que nos alimentamos da sua essência de vida! Chupamos teu sangue até você morrer e passamos a mesma maldição a você!”. Sai daquele lugar revoltado e voltei pro meu caixão.
Vocês acham que o que aconteceu comigo foi ruim? Vocês não querem saber o que aconteceu com o lobisomem... O que aconteceu conosco? Éramos assustadores... Éramos a transpiração do mal... Hoje parece que somos feitos de purpurina e cheio de amor para dar... Vou me ater no meu caixão... Acordem-me no fim dos tempos!