As aparências enganam... meeesmo! - II
Quem conhece a minha mãe, sabe que ela nunca foi de se dar a desfrutes ou veleidades. Depois de viúva, fechou-se num casto recolhimento, apesar de sempre ter sido muito ativa e independente no que se refere a cuidar da casa, da filharada, dos parentes e das poucas amigas que dela precisassem.
Por isso estranhei muitíssimo naquela tarde quando, ainda adolescente, atendi o telefone e ouvi a voz apressada e cheia de urgência da minha severa mãezinha dizendo:
-- Presta atenção! -- ela sempre começava assim, sabendo que sou meio avoada -- Estou num motel na BR-40, com um guarda rodoviário, e preciso que você me faça um favor com urgência.
-- O quê?!? -- exclamei agudamente surpresa, tendo registrado apenas três palavrinhas: "motel" e "guarda rodoviário"...
Em seguida, caí na mais descabelante gargalhada que já dei na vida! Daquelas de perder o fôlego e dobrar o corpo todo pra frente.
Quando me recuperei, a duras penas por sinal, pude ouvir a explicação.
Ela havia ido a um loteamento perto da divisa do DF com Goiás, se não me engano à procura da casa de uma faxineira nossa que andava adoentada e, inadvertidamente, trancou o carro com a chave dentro. Como naquela época só existiam celulares nos livros de ficção científica e mesmo os telefones fixos ainda eram artigo de luxo, especialmente na periferia, ela precisou pegar carona com um guarda rodoviário que estava passando por ali, cujo qual lhe informou que o telefone mais próximo se encontrava num dos poucos motéis que existiam na região.
Aaaahhhh bom!
Lá fui eu de táxi pra levar a chave reserva. Não no motel, claro, mas já de volta ao tal loteamento.
E, claro, ainda com um imenso e irônico sorriso pregado no rosto, ameaçando virar novamente uma baita duma gargalhada à medida em que a minha severa e constrangida velhota fechava mais e mais a cara. Afinal, "o quê que os outros vão pensar?"
E, pra que não paire nenhuma dúvida quanto à veracidade dos fatos, acrescento que uma das minhas irmãs estava com ela o tempo todo. E com a mesma expressão ultradivertida, em tudo e por tudo semelhante à minha.
Mais tarde, já em casa, cada irmã que chegava da escola ou do trabalho e ouvia o nosso cada vez mais cômico relato, se juntava a nós nos sempre renovados acessos incontroláveis de divertidíssimas gargalhadas. Até a minha mãe acabou rindo com a gente.
Aliás, esse causo se tornou uma das pérolas do nosso folclore familiar.