CABERNET A LA CRÈME BRULÉE!
Não era a primeira vez que eu me deparava com tal situação...digamos, de DIETAS paradoxais..
Estávamos ali reunidos num restaurante, nós e alguns amigos dos amigos, quando ele se sentou à mesa bem a minha frente.
Fomos apresentados, e nos preparávamos para a exposição da aula em Power-Point, quando o garçon nos encheu as taças com o Cabernet Carmem.
Assenti o brinde, embora soubesse que apenas "molharia meu bico" num ato de companheirismo, posto que eu assumiria a direção na volta para casa.
Logo a seguir, nos apresentavam sobre a mesa uma cesta de pães da casa, todos maravilhosos, com as demais iguarias do vasto couvert, que logo foram recepcionados pelo meu mais recente amigo com a seguinte desculpa: " hoje estou fugindo de comida,, quero mais é que a aula acabe logo...porque estou de dieta".
Engraçado que nesses eventos TODOS sempre estão de regime...inclusive eu.
Mas imediatamente percebi que, de fato, a minha dieta era mais honesta.
Não demorou segundos e eu não acreditava no que via.
Ele se apoderou do prato coletivo de antepastos e com seu próprio garfo o transformou em prato "individual'.
Enquanto degustava a todos os Patês e iguarias, ia me discursando sobre as comidas do mundo.
Fiquei tonta de tanto rodar pelo planeta.
Com ele, passeei pelo universo da cultura, da arte , e da gastronomia de todos os continentes deste universo.
Degustei no seu longo discurso a culinária árabe ( a sua nacionalidade), judaica, asiática, europeia, a italiana e por último a francesa (a sua especialidade na gastronomia caseira).
Eu já estava empanturrada sem mesmo ainda ter provado nada e muito menos sair do meu lugar!
Em pouco tempo, percebi que se apossou dos demais pratos de couvert, inclusive do daquele que pertencia ao seu amigo judeu que estava ao seu lado.
"Aqui não existe faixa de Gaza" ele lhe comentou sorrindo...
"Peraí...esse é meu!", reclamou o amigo.
"Hum, provou dessa berinjela?" " E desse tomate seco"?
Aliás, estava difícil se provar algo ali, em tempo real, posto que as especiarias "sumiam" ao seu tão ávido regime.
Lá pelas tantas colocou uma azeitona preta e gigante no meu prato.
"Vamos, coma um pouquinho, está tão boa..."
Terminada a aula, passaram o menu da noite.
Ele provou dos três pratos das possibilidades "a la carte".
Eu mal consegui terminar o meu Badejo com folhas.
NA mesa de sobremesa fui comedida, mas não dispensei o meu preferido brownie. Um pedacinho de fato, que chamou a atenção da mesa...e mais ainda dele! Ficou inconformado com a minha moderação.
Estava mais que saciada e entendi que o doce já era um exagero.
De repente, ele apareceu com seu prato lotado de doces MAIS um creminho flambado a parte.
"Quer um pouquinho?"
Embora o conhecesse "de vista" lhe expliquei que nunca o havia provado.
Então, caí no pecado de lhe perguntar sobre o tal creme que cheirava baunilha, me arrependendo logo em seguida.
Depois da aula de culinária francesa e da localização do melhor Café de Paris especializado em CRÈME BRULÉE, que em plena São Paulo, me pareceu "logo ali" ao lado do LOUVRE, a minha maior surpresa da noite: ele voltou da mesa de sobremesa, pela enésima vez, com uma gentileza irrecusável:
"Tome, este é para você, um creminho que você nunca mais o esquecerá, experimente, quebre a sua casquinha crocante com a colher e saboreie a especialidade dos deuses da França..."
Em mim não cabia mais nada. "E agora?", pensei.
Fiquei amarela da cor do creme...mas devagarinho consegui ser educada.
De fato, além da delicia da culinária, eu jamais o esquecerei.
"Mais cabernet, senhora?", me perguntou o garçon.
Foi ali que percebi que a minha educação tem limite.
Já as dietas...