CINCO ESTORINHAS COLORIDAS
1.
Era uma linda mulher de olhos verdes. Usava pulseira verde e anéis com pedras verdes. Pintava o cabelo de verde. Vestia-se sempre com vestidos verdes. Adorava ouvir Nat King Cole cantando “Aquelles ojos verdes...” Torcia pelo Palmeiras, mas casou-se com um cruzeirense de olhos azuis. É um típico acidente de daltonismo crônico.
2.
Era um homem de olhos azuis. Usava um relógio de pulseira azul e tinha um anel com pedras azuis. Pintava a barba de azul (mas não era o Barba Azul). Vestia camisas azuis. Nascera em Pedra Azul. Adorava ouvir e cantar “blues”. Torcia pelo Cruzeiro. E casou-se com uma mulher que tinha os olhos azuis. Caso típico de coerência de cromia. Mas o filho deles virou militante do partido verde. Caso típico de traição cromática (ou cromossomática).
3.
Era um homem amarelo. Tinha os dentes amarelos. Cabelo todinho amarelo. Usava calças e camisas amarelas. Guiava apenas carros amarelos. A casa era toda pintada de amarelo. Sua namorada era também amarela. O seu animal de estimação era um pica-pau amarelo que flertava com um tucano também amarelo. Sua canção preferida era o “yellow submarine”. Morreu de febre amarela. Caso típico de humor negro.
4.
Era um homem vermelho. Tinha os olhos vermelhos. Era simpatizante do Khmer Vermelho. Usava roupas vermelhas. Seus sapatos eram vermelhos. Sua casa era toda vermelha. Casou-se com uma mulher negra. Seu filho nasceu rubro-negro. É um caso típico de coerência futebolística.
5.
Era um homem branco. Usava chapéu e terno branco. Calçava sapatos brancos (mas não era o homem do sapato branco). Seu cabelo era todinho branco. Só usava gravatas brancas. Colecionava armas brancas. Ia se casando com uma pele-vermelha. Mas, na hora do sim, deu-lhe um branco. Sua quase-esposa ficou azul de ódio. Aí, as coisas ficaram pretas pro lado dele, que amarelou. É um típico caso de overdose cromática.
(José de Castro, in Quem brinca em serviço. Natal/RN: Sebo Vermelho, 2003)