A Paranóia Suína Também Pega
 

            Fui ao Inss que agora mudou muito. A entrevista foi marcada com antecedência e o atendimento vestiu uma pontualidade britânica. Fiquei feliz por ser dignamente tratado, como todo brasileiro merece. Durante os minutos em que esperei, graças ao hábito de chegar cerca de 20 minutos adiantado, o que me daria tempo de ler um conto, percebi que alguns funcionários espalhavam cartazes dizendo:
            ¨Gripe Suína – Vamos cuidar:¨
            - Não dê aperto de mãos.
            - Caso tussa ou espirre, use um lenço descartável ou saia do recinto.
            - Lave as mãos com frequência.
            Naquele momento um pânico me subiu pelo corpo esquentando-me as faces. Nada contra as regras, com exceção da segunda que carregava um certo exagero. Devo esclarecer, a bem da verdade, que sou alérgico desde as primeiras fraldas (e naquele tempo não eram descartáveis). Assim, sou um profissional na arte do espirro e da tosse seca. Fiquei logo aflito, com medo de ser mal interpretado ao simplesmente tossir ou liberar um dos meus famosos acessos de seguidos espirros.
            - Tudo bem, basta usar o lenço. – Diz o leitor.
            - Que lenço? – Pergunto eu. Nada de lenço. A aflição aperta, como o cerco de índios à caravana. Escuto os tiros, os gritos e as carroças tombam. Preciso de um lenço. Vou atrás do banheiro e a ¨neura¨ vem junto. A porta de blindex possui marcas nítidas de dedos por todo o seu corpo; inclusive na maçaneta de madeira lustrosa. Fico parado esperando que alguém a empurre e passo rapidamente para o outro lado aproveitando a brecha, assim como os fantasmas iniciantes.
            Pergunto pelo banheiro e subo as escadas sem tocar no corrimão. A contaminação esta por toda parte. Aflito, vejo que a porta do banheiro está fechada. E agora? Quem segurou ali? Estará contaminada? Devo dizer que esses pensamentos não me acompanhavam antes, foi tudo culpa do bendito cartaz. Espero para aproveitar a saída de alguém, o que não demorou muito, e adentrar por aquele vácuo. Sair do banheiro é mais fácil; pego toalhas de papel para a função de lenço e abro a porta com uma delas, fazendo o mesmo com a porta de vidro lá fora. Estou virando Monk.
            Volto à espera e logo sou atendido por uma funcionária com aquelas máscaras. Reparo que a maioria não as usa, embora repouse um espécime sobre o balcão de cada servidor. Será que tem uma para os clientes? A atendente encontra-se grávida, com uma barriga saliente, o que justifica seus cuidados. O bebê não pode nascer com a gripe Palmeirense.
            Evito, inclusive, a conversação, para não ser mal interpretado. Aperto de mãos nem pensar. O cartaz, no guichê, me encara ameaçador. O guarda, atento, pronto a enquadrar os novos fora-da-lei, monitora milímetros do ambiente. Será que sacaria a arma e fuzilaria quem entrasse em crise de espirros? Talvez eu me torne uma vítima colateral. Vejo meu corpo estrebuchado e a manchete no jornal:
- Morto por espirrar! – Começo a rezar. Sobe um engasgo pela garganta. O tempo seco, poeirento, e o ar-condicionado causam irritação nas mucosas. Escapa-me um pigarro seguido por uma minúscula tosse. Minha visão lateral examina a atendente. Parece não ter percebido ou ocultou por uma réstia de educação. A toalha tampou a boca, menos mal. Em pouco tempo ela retira a máscara:
            - Essa coisa me sufoca. – Diz sorrindo.
            Pensei em dizer o mesmo do cartaz, e daquela situação toda, mas acredito que seria desnecessário. Melhor poupar o ar dos nossos perdigotos...