FÁBULAS FABULOSAS ou Classicozinhos Infantis Revisitados - CAPÍTULO V
Era uma vez um alfaiate muito habilidoso, mas também muito ambicioso e inescrupuloso, que pretendia tornar-se o personal styler do Rei e, assim, cooptar muitos fregueses entre os nobres da Corte e, de quebra, abocanhar umas benesses governamentais para enriquecer de modo fácil e rápido.
Para tanto, espalhou entre os súditos do Reino o boato de que havia tramado um tecido muito belo e nobre, o qual, entretanto, tinha a especial característica de só ser visto por aqueles que possuíam pureza de coração e nobreza de caráter.
Sendo o Rei, Lulis XIII, extremamente vaidoso e exibido, além de plenamente convicto de que era um poço de virtude e bondade, ao ouvir tais boatos não se conteve e foi visitar o alfaiate.
Lá chegando, ficou desconcertado com o que viu: o alfaiate, malandro que só ele, alisava um suposto tecido sobre uma bancada e, com a tesoura em punho, fingia cortar as peças com as quais montaria um belo traje real. E, enquanto assim procedia, falava com a voz melíflua característica dos intrigantes:
-- Veja, Vossa Majestade, que belo, nobre e precioso tecido, digno dos mais altos e poderosos Reis que possam existir no mundo, tais como Vossa Majestade, que é O mais poderoso e O mais alto entre todos, além de ter a virtude de um santo e a bondade de um filantropo...
O Rei Lulis XIII disfarçou, deu uma tossidinha, remexeu os pés em desconforto, olhou em volta pouco à vontade, mas não Se furtou a elogiar efusivamente tanto as nobres qualidades do tecido, como a perfeição do corte de tão talentoso estilista:
-- Cumpanhêro alfaiáti, eu num tenho dúvida ni'uma di qui nunca na istória dêssi rêinu haveu um pano mais bunito du qui êssi, nem uma rôpa mais manêra du qui essa! Ocê vai acusturá uma ingal que essa aí pa eu, qui eu vô li pagá cum trocentas mueda di ôro qui eu tava guardano pra duar pru MST - Monarquistas Sem Título.
O alfaiate agradeceu profusamente e, pouco tempo depois, foi ao palácio, cheio de mesuras e rapapés, levando nos braços com todo o cuidado e atenção o suposto Traje Real.
O Rei Lulis decidiu exibir Seu novo traje, com grande pompa e circunstância, durante o desfile anual que fazia pelas ruas do Reino para angariar os aplausos e a aprovação dos Seus fiéis e amados súditos, conquistados às custas da generosa e demagógica bolsa-vassalo, entre outras bondades -- ainda que ilusórias -- totalmente desinteressadas.
No dia do desfile, porém, foi incapaz de encontrar o traje em Seu closet real. Chamou, então, Sua nobre esposa para ajudá-Lo:
-- Ô Martha Elizabeth, ocê pega pa Eu u Meu tráji nôvu lá nu closédi?
Algum tempo depois, a rainha retorna desconcertada:
-- Ô Lulis, eu num dô conta di vê êli não.
-- Uai, ocê tumén não?
-- Ó, u mió é nóis fingi qui vê a rôpa, sinão tôdu múndu vai sabê qui nóis num tem virtúdi nem bondádi...
E assim fizeram. Antes, porém, tiveram o cuidado de mandar propagar, mais uma vez, pelos quatro cantos do Reino, que só aqueles virtuosos e bons é que poderiam enxergar o tal traje.
E lá se foram, garbosos e pomposos em Seu deslumbramento desmesurado.
O Rei passava e os súditos faziam um esforço sobre-humano para não rir ou se embasbacar, pois que isso acusaria o fato de que eles não eram capazes de ver o traje e que, portanto, não tinham bondade nem virtude.
Contudo, no meio da multidão, um singelo menino do povoado não conseguiu se conter e gritou:
-- O Rei está nu!
E logo um coro de vozes de meninos e meninas se levantou:
-- O Rei está nu! O Rei está nu!
Aí virou festa! Todo mundo se soltou e riu e gargalhou e pulou e dançou e gritou que o Rei estava nu!
O mico só não foi pior porque uma súdita militante do PCB - Partido dos Camponeses Bobocas, sentindo obrigação de ser fiel às orientações das bases aliadas, jogou um rude e tosco manto sobre o atarantado Rei, de modo a esconder Sua nudez nefasta.
E o desonesto alfaiate foi julgado, condenado e preso. Mas, como era réu primário, com a progressão da pena em pouco tempo já estava de volta à sua alfaiataria, desta feita em outro Reino, para continuar aplicando seu 171 ad infinitum, amém.
Moral da história: quem tudo quer, tudo mostra... mas tudo mesmo!