Meu amigo crente em : Férias do barulho

Enquanto eu tirava a mesa do jantar, faraó viu minha cutícula do mindinho, me chamou de porca imunda e me mandou pro calabouço.

Estava mesmo precisando de um descanso. Só que dessa vez, fui algemada e pendurada pelo teto feito lingüiça de mercado, e reconsiderei a frase de que o trabalho dignifica o homem.

Vinte e três dias depois, sentindo-me suficientemente defumada, comecei a não sentir meus pulsos e as gotas de suor escorridas do cabelo já não matavam minha sede de forma satisfatória.Estava levemente incomodada. Meus companheiros de confinamento,também pendurados ( alguns de cabeça para baixo e tendo a sorte de vivenciar tudo por novas perspectivas) pareciam descontraídos e à vontade, até porque o assunto principal era faraó e sua família e nisso, varavam a noite fofocando e fazendo galhofas impagáveis.

Pendurado ao meu lado, meu amigo crente. Sempre concentrado e tentando se socializar, ria ora sim ora não. Eu sabia que nada daquilo o abalava e mentalmente, ele estava era repassando o antigo testamento, exercitando assim, sua leitura dinâmica e sua fé.

Disse, meio acanhada:

_ Sollom...estou um pouquinho exausta. Queria tanto fazer xixi sentada...

Ele me olhou com pena por minha fraqueza e estupidez. Quantos não gostariam de estar ali...

E numa atitude de encorajamento a minha pessoa, fechou os olhos e num incrível vibrato em lá maior, abriu sua boca grande e louvou como os negros batistas de Nova Orleans ( que ainda estariam por vir):

ÔÔÔÔ happy daaaaayyyyyyyyy!!!!!!

ÔÔÔÔ happy daaaaaayyyyyyyy!!!!!!

ÔÔÔÔ happy daaaaaa-eeeee-yyyyyyyy!!!!!!

When Jesus waaaaaaaashed

ÔÔÔ He waaaaaashed

My sins awaaaaaay!

Foi uma comoção.

Todos pararam de fofocar e seguiram em coro. E eu cantei junto.

O que mais se há de fazer nessas horas?

Depois do castigo formamos uma pequena banda e nos apresentávamos em grutas, de madrugada. O ingresso era uma porção de damascos, mas descobrimos que valíamos abacaxis no mercado negro.

Ficamos envaidecidos. Realmente, tínhamos talento.

Zilmara Dahn
Enviado por Zilmara Dahn em 27/07/2009
Código do texto: T1721885
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