CRIANÇA TEM CADA UMA...
Minha irmã, sempre muito preocupada em criar seus filhos sem preconceito racial, ensinava-lhes constantemente que a cor da pele não importa, que somos o que somos. Aproveitava e lhes dizia que os negros haviam sofrido muito, haviam sido escravos e finalmente conseguido a liberdade para viver em paz.
O seu filho caçula parecia muito se interessar pelo assunto e sempre instigava à mãe a lhe contar mais sobre o tempo-negro da escravidão africana no Brasil. Ela apenas conhecia parte da história e procurava passar-lhes, inclusive, a sua opinião e ressentimento quanto ao fato acontecido no Brasil.
Certa feita, estava ela e os filhos num restaurante nada popular e os menos brancos eram poucos no ambiente. Entre conversas variadas e alguns ensinamentos de etiqueta, o menino viu adentrar um policial negro que passou junto à mesa em que almoçavam. O menino, na inocência de seus seis anos de idade, puxou logo conversa com o policial. Elogiou a sua farda, olhou com um pouco de medo o revólver que o policial portava na cinta, mas logo viu que o policial era gente boa pelo sorriso branco e cativante que ele lhe dirigia. Foi aí que o menino convidou-o para almoçar com eles. Os pais reforçaram a idéia, o policial sentou-se junto a eles, mas agradeceu o convite.
A conversa com o policial estendeu-se a outros componentes da família, o menino parecia querer conversar apenas ele com o rapaz. Num dado momento, sem saber como agradar mais ainda ao policial e olhando-o nos olhos passou a mão no seu braçinho branco onde pelos ainda mais brancos brilhavam e falou enfático:O senhor e eu, nós dois que somos brancos sabemos...
Nessa hora, a mãe o interrompeu com um beliscãozinho de alerta. O menino se calou amuado, não terminou de falar. O policial sorriu, percebendo a situação disse que o menino era muito simpático, mas que precisava ir-se. Despediu-se e só quando a família o viu dobrar a esquina conseguiram rir e muito da situação.
O menino continuou amuado e disse que havia tentado agradar ao guarda para que ele se esquecesse do tempo da escravidão.