O cão do Chiquinho

Houve um tempo em que minha cidade era detentora dos mais valentes cães do interior paulista não só pela valentia, mas também pela obediência cega ao seu dono e amigo, pela abnegação, porque não, pela teimosia nunca vista em cães de caça naquelas bandas. Caça pequena, leve, não tinha bicho bravo e nem grande por lá!

Chiquinho, um mineirinho do tipo quietinho, teve a primazia de possuir um cão que reunia todas as características já ditas, os dois,

cão e dono já eram conhecidos de todos pelas profícuas caçadas que empreendiam. A obediência e teimosia do cão e a pontaria de Chiquinho garantiam sucesso.

Aconteceu que um dia, numa caçada de codorna, o cachorro farejou uma dessas avezinhas sob um pé de “Barba de Bode” que é onde codorna costuma fazer ninho. A ave encarou o cachorro e ficou esperando um vacilo para voar dali o mais rápido que pudesse. Mas o cão não se desviava dela. Ficou em posição de ataque e abanava o rabo nervosamente. Chiquinho se preparou para atirar no vôo da ave depois que o cão latisse como sinal para o tiro.

Foi se ajeitando, rodeando, se afastando acertou a posição e...

Chiquinho não viu o barranco e ao afastar-se caiu numa ribanceira, desmaiou e foi acordar no hospital, uns três dias depois.

A pancada lhe provocou amnésia parcial e não se lembrava onde estivera, nem que fim levou seu cão. O tempo passou.

Aconteceu que anos depois Chiquinho estava aplainando com seu trator um loteamento lá pelos lados do cemitério, quando desconfiado viu um esqueleto de cachorro frente a uma barba de bode seca. Lembrou-se então do que houve anos atrás.

Não pode ser, pensou ele. O esqueleto do cão estava inteirinho, ainda na posição de ataque! Chiquinho não queria acreditar. Deu a volta no esqueleto do cão, olhou , olhou...

Resolveu olhar de longe sob o arbusto seco e viu o esqueleto da codorna, com as asinhas meio que abertas, pronta para alçar vôo!

O matuto mineiro teve então certeza que era seu cão de caça e com saudade e sem pensar muito chamou carinhosamente pelo nome do cão. Pasmem! O cão alegremente balançou a rabo !

Mas infelizmente, esqueleto que era, desmontou-se completamente ao manifestar a alegria pelo reencontro.

A codorna, coitada, teve a mesma sorte. Na distração do cão aproveitou para se evadir do local. Até voou alguns metros antes de ter seus ossos espalhados no terreno...

Causo sério...

Paulo de Tarso
Enviado por Paulo de Tarso em 01/06/2006
Reeditado em 02/09/2006
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