Bate bate bate na porta do céu - Parte II

Matias. Por que este nome? Malditos papai e mamãe. Olhos castanhos. Por que raios não capricharam e me mandaram com dois lindos olhos azuis? Peito peludo. Que asco! Não poderia ser ele um daqueles meninos lisinhos, estilo fisiculturista, ou "chama pedófilos"? Uma infinidade de sandices passavam-lhe à mente. Como poderia ter feito mais sucesso com as mulheres, roubado mais biscoitos da casa da vovó, ou como poderia ter dado um pontapé no maldito cão que lhe mijou as calças novas em pleno reveillon. De que adiantaria afinal? Estava morto, e nada mais podia questionar.

Ansiosamente aguardava o retorno de Menezes, o bandido que acreditava ter sido seu amigo, mas que ali estava para efetivar sua morte. Já tinha preparado um belo golpe de canhota para acertar-lhe no queixo. Mas será que conseguiria tanger objetos vivos, agora que era apenas um ectoplasma caçafantasmariano? O tempo diria.

Como que por encanto, eis que surge o famigerado Menezes. Trajando um belo terno cor de cocô e com uma pasta de couro de bode nas mãos, dirige-lhe a palavra:

- Vamos então Matias. Sua presença é requisitada sem demora. E por favor, não me venha com agressividade. Seus socos de esquerda serão inúteis contra mim.

Espantado, Matias questiona:

- Como sabias que eu estava querendo te espancar?

- Aqui, neste local, eu tudo posso, tudo vejo, e sou imune à violência ou ofensas verbais.

- És um vidente? Ou também estás morto?

- Não. Sou um advogado. E prometo te processar até no inferno se levantar-te contra mim.

Matias achou melhor deixar esta ideia de lado. É de conhecimento de todos que com advogados não se brincam. Eles são tão malditos que podem causar problemas até na outra vida, ainda que o morador do outro lado não seja um deles. Por bem, achou melhor acompanhá-lo.

Um corredor ladeado de anjos nus, com seus sexos à mostra, era o caminho a ser percorrido. Mas que diabos era aquilo? Não diziam que os anjos não tinham sexo? Se aquilo que pendia das pernas daquele anjo moreno não era uma genitália masculina, certamente era uma anomalia celeste. E das grandes. Se já não estivesse morto, certamente estaria com medo agora.

- Chegamos. - disse Menezes, ajeitando seus óculos.

Estavam diante de uma imensa porta dourada, ornamentada com motivos florais, celestiais e, se não estava enganado, com a reprodução da cena de um cavalo copulando com um rinoceronte.

- É aqui? Que porra é essa Menezes?

- Não posso fazer mais nada Matias, minha missão acaba aqui Agora é com você, meu velho...

Menezes bateu palmas e uma nuvem cor de abóbora o envolveu, fazendo com que desaparecesse em seguida. Silêncio. Solidão. Agora era só ele. Atentou para suas costas e viu que o anjo cor de jambo vinha atrás dele com aquele penduricalho celeste do caralho...era melhor apressar sua entrada.

Bateu três vezes na porta e aguardou uma resposta. A porta lentamente se abriu, e uma poderosa voz a lá Cid Moreira o convocou formalmente:

- E O SENHO DISSE: "CHEGA AE MANO MATIAS, QUERO LEVAR UM LERO CONTIGO"

Medo.