O Clube de Piadas
Quantas vezes não nos perguntamos se é válido contar piadas antigas? Corremos o risco de sermos rejeitados com um muxoxo: “essa é velha, já conheço há muito tempo”. O meu falecido sogro tinha a mania de contar sempre as mesmas histórias. Parece que a medida em que vamos envelhecendo perdemos a capacidade de absorver novas idéias e nos concentramos nas antigas; talvez seja uma forma que os velhos encontraram de preservar a memória, de repetir, sem parar, as desventuras familiares, rememorando, perseverando, fabulando coisas antigas, relembrando o nome das pessoas que já morreram há muito tempo, como se elas continuassem existindo... Bem, elas continuam existindo, mas somente na memória de quem está vivo.
As histórias são também assim, tem que ser recontadas para que permaneçam, pois, afinal, tem gente nova nascendo que ainda não conhece as velhas piadas. Logo é válido, super válido reconta-las. E, de fato, as piadas não têm donos, elas são de quem as conhecem e as sabem contar.
Quanto ao meu sogro, sugeri que ele numerasse as piadas, assim não precisava reconta-las, bastaria que dissesse o seu número de catálogo que eu lembraria da piada, e cairia na gargalhada...
Mesmo sem querer acabei citando, no último parágrafo, uma velha piada, aquela do clube de piadas. Mas não é essa a piada que quero contar, e antes que algum eventual leitor que eu possa ter comece a desanimar dessa leitura, deixa eu contar logo o meu causo.
Tinha um grupo aqui da cidade que costumava pescar todos os anos no Pantanal. Passavam meses preparando a expedição, e quando chegava a data marcada, empreendiam viagem e desapareciam por semanas.
As mulheres ficavam super ansiosas, aguardando o retorno de seus maridos.
Quando voltavam traziam muitos quilos de peixe. Chegavam cansados, amor nem pensar, queriam só dormir.
Teve um ano em que elas insistiram para ir junto, queriam também pescar lá no Pantanal.
Os maridos tentaram demove-las, era muito longe, era cansativo, teriam que dormir em barracas, a comida era ruim, tinha mosquitos transmissores de malária, cobras, muitas cobras, jaguatiricas, plantas espinhentas, cipós venenosos, não tinha banheiro, enfim, muitas adversidades capazes de tornar a aventura um pesadelo.
Mas elas não desistiram, queriam ir de qualquer jeito. E foram.
Após milhares de quilômetros de estrada, a estrada que era asfaltada, muito bem conservada, uma BR de pedágio, virou uma estadual com buracos, para se transformar em estrada de terra, até que, finalmente, tinha tantos buracos que tiveram que descer de seus carros confortáveis, para terminar viagem na carroceria de caminhão. Mas estava tudo programado. O grupo era tarimbado em pescaria e tudo estava previsto. Contratavam sempre o mesmo grupo de apoio, os mesmos peões, de forma que já havia um caminhão esperando, no local combinado.
As mulheres já meio cansadas e um pouco arrependidas por terem embarcado naquela furada, um verdadeiro palpite infeliz, tiveram que ser içadas e empurradas com muito custo para cima da carroceria. Eta peso, foi difícil colocar aquelas matronas gordas no veículo! Mas foram. E toca de pegar buraco e solavanco. O caminhão andava devagar, tentando esquivar dos buracos, e o percurso final de quarenta quilômetros demorou uma eternidade.
Já estava anoitecendo quando chegaram ‘as barrancas do rio dos peixes, e a equipe, sempre os mesmos peões, já estava de prontidão para descarregar a bagagem.
A descida foi um inferno, se levantar foi difícil, imagina apear! Os peões, com cuidado desceram os corpos pesados, as malas e os apetrechos.
Nisso, um peão desavisado comenta enxugando o suor da testa: nossa, doutor, vocês trouxeram umas puta feia esse ano, hein!
Bom, aí esta. É claro que as mulheres vão odiar a piada. É história de pescadores! Quanto ao clube de piadas mencionado acima, a conclusão é que não basta falar o número da piada. Só o número não é capaz de garantir a gargalhada: é preciso saber contar! E eu não estou escutando ninguém rir aí!