Bate-boca supremo

Minha primeira indagação matutina foi contra a idéia de coisa suprema. Só o azar é supremo. Diante de bate-boca supremo reconhecemos o quanto a simplicidade obriga o fim da idéia de coisa poderosa maior que a humildade. Mas cuidado com a humildade! Pode ser apenas o ar do complexo de inferioridade.

“Poder” é palavra “feia” quando a recusa está longe da impotência. O guarda é poderoso. O vereador é poderoso. O prefeito está no poder e é poderoso. O guarda ergue a mão. O carro para. Quanto a nós somos atropelados.

Há milhares de exemplos cotidiano de poder. O vizinho que espanca o cão emprega sua noção de poder para agir de forma livre e indevida. O dinheiro vivo e escasso, o mesmo que gera o sonho de igualdade monetária, alimenta a idéia de “poder” que a riqueza guarda. Como o guarda que guarda a riqueza do poder. A palavra “poder” na frente das outras manifesta apenas a nossa incrível submissão histórica. O fruto amargo da lendária escravidão iletrada de nossos destinos.

Multidões arrastadas sem direção e solitárias todos os dias levantam-se com sede de posse. Todos possuem no âmago a obsessão por grandiloquencia e eu por balas de menta. O fato é que todos nós desejamos obter tudo ao preço colado das necessidades.

De tanto brigar contra a palavra “poder” fico com medo de que seja a minha vez de praticar encantamento. Para tanto improvisaram a loteria que é para pouquíssimos o gozo sobre as multidões em estado de raro privilégio. Loteria já é um tipo imaginário de corrupção coletiva.

Cuspir na rua já é corrupção. Bate-boca nem se fala. Portanto Gregório de Mattos Guerra vive nas palavras poéticas do imortal reino: “O velhaco maior sempre tem capa”. Elis Regina Vive. Rita Hayorth vive. Tudo vive na O.A. B. Até o advogado dos processos abandonados, esquecidos do prazo, indo para Berlim ou Novo Hamburgo; deixando o Juíz tranquilo... Dando ganho de causa ao colega que compareceu. Tem o poder de escoar o prazo dando com o martelo na cabeça do cliente abandonado de recurso. Cliente sem Procon que paga assistência social, mas não é assistido. Criatura em casa, alienado da falsa representatividade, provavelmente arrumando as notas para pagar o “doutor” que passeia com o processo engavetado no escritório. Funciona assim o poder, cegamente. Correto dento das regras.

De poder não dou aula, nem sou professor. Ensinaria de um modo diverso a busca pela igualdade através do respeito. Não tenho credo e o respeito é a minha religião. Mas o que é o respeito? Uma área intocável. E só o poder é intocável. Resolvo parar de filosofar inultilmente e perguntar ao primeiro passante da rua o que é.

- Poder é ganhar uma fortuna como orador além das passagens aéreas!

Digo a ele com respeito:

- Você está na mídia.

Para alguns a primeira indagação da manhã já serve de princípio.