Gol Inexistente
As lembranças de um locutor brotam como jogadas. Rápido no comentário do passado e com a precisão de sempre: a equipe não jogou nada. Por que o técnico Romualdo não fez troca no time? Ficou no banco com olhar de vaca ao crepúsculo. A torcida estava para o lado do Alvarenga Futebol Clube, por quê? O time acabou derrotado por unanimidade. Jogou mal. Todos apreciavam a idéia do Silveirinha pela lateral, subindo para cabecear, logo disparando para frente no ataque. Sempre para frente no ataque e sempre para tráz na defesa. O fato é que o time perdeu gol. Começava a narrativa na Hora H. Esportiva com o bordão: “Eu crônista de vocês!” Acrescentando o prefixo ZYK das ondas da rádio. Seguia direto ao assunto. Foi um bom lance do Cacau sobre o bagre. Bom demais para ser naquele tempo e naquele campo. Apertava os sobrolhos com atenção. Quando é a trave quem coloca o time numa situação de empate o jeito é passar da retranca para o ataque. Caqui chuta para Banana. Banana entrega para cacau. O azar de Cacau ainda no primeiro tempo revelou a impressão desoladora daquele que sai do lance brilhante fugindo de um lance péssimo. Julião havia fabricado escanteio com as agarradeiras das chuteiras. Nandico realizou passe melhorado depois de perder a bola sempre que convidado, todavia resultando num lance interessante e o primeiro da partida. Certo que perdeu a chuteira de Cinderela, porém com a ponta do dedão do pé tocou justo para Oduvaldo. Oduvaldo estudava reflexivo o canto esquerdo do campo perdido em meditações. Como aquele que procura algo existencial longe da bola e do gol. Logo foi cercado e pressionou o ar comprimido do chute flutuante contra o pé sólido tamanho quarenta e cinco do Miau. O globo esmagado subiu raspando canela, umbigo, peito, ponta de nariz, pedaço de pele, células da imaginação como se fosse atraída por satélite. Subiu acima do estádio para muito loonge das traves e perto das trevas. Tudo diante do olhar pasmo do juiz que vermelho de raiva destacou um cartão amarelo aos espremidos da jogada. Apitou interrompendo até mesmo a transmissão. Bola no satélite! Por sorte havia os sortidos comerciais de todo o tipo e valor.
Os jogadores sempre correndo na sequencia de toques para pulverizar a defesa adversária. Longe fabiano goleiro levantou as orelhas para melhorar os olhos na direção certa da bola, estava no dever da defesa pelo menos naquele lance. O escore de um a zero contra o Alvarenga F.C. pulsava em muitos corações distantes. Todos lutando pelo direito a taça e ao garfo nas refeições. O Fabiano andava fora de forma e longe do peso. Esticou os braços olhando firme para a esfera. Pé e bola, bola e pé. O vento cortado pela rede soprando atrás de si modulava o grau de tensão nervosa. Feito míssil o objeto flutuante atravessou meteórico, explodindo na sua pacífica direção. Em breve estaria dentro da pequena área geográfica do infeliz o visivel tormento. Se ele nada fizesse em segundos seria esfarelado pelos gritos da cólera humana reunida na pequena palavra "gol" quando tomado contra. Olhou para o relógio calmamente. Herói monumental daquele instante para o caminho triunfante, e, foi assim; empurrada com a ponta do dedo indicador a esfera ameaçadora. Desviou meio fracasso para escanteio. Foi possível ouvir o urro enganado de um desânimo coletivo atordoado. Naquele momento malfazejo o velho narrador gritou três vezes: gol, gol e gol! Não havia sido. Era o gol não havido. Toda cidade interiorana comemorou por breves instantes a taça prometida que ele teve que desmentir no ar. No ar e no tempo em que o empate servia como vitória colocando um ponto final na disputa. (Série Futebol Imaginário).