Um legislativo maluco
- Está aberta a sessão!
O Presidente da Câmara Legislativa abre os trabalhos sempre com estas palavras canoras e simples. Tem ao seu lado um demagogo gordo com suor nas axilas. É o encarregado da leitura dos processos para tramitação na sessão ordinária do dia.
- Processo número 100/69 que trata do envio de verbas para construção de murinho em torno da escolinha rural no valor de “oitenta mil reais”. Processo sem nenhum parecer da Comissão de Parecer.
Presidente – Sem parecer da Comissão?
- Sem parecer.
Presidente – O processo está em votação. Quem é favorável fique como está ou do contrário se manifeste. Processo aprovado por unanimidade. O Presidente observa os vereadores reunidos em silêncio na plural atividade e reitera:
- Aprovado por unanimidade! Reina um silêncio degradante.
O próximo texto, sobretudo demanda grande atividade mental. O executivo pede aprovação de “cento e cinquenta mil reais” para custeio de mão de obra e atrasados de dois servidores capacitados contratados para prestação de serviço.
- Senhores! Há servidores trabalhando com os bolsos vazios, sem um centavo sequer, laborando sem remédio nem custeio.
O relator do processo é cuidadoso em assegurar o seguinte: caso a verba não seja aprovada pela Casa Legislativa haverá “configuração de enriquecimento” por parte do Poder Público, o que é matéria desigual indo de encontro à jurisprudência. Na platéia um gaiato resinga em voz alta:
- O que fazia o prefeito em Paris que não pagava os pobres funcionários?
Há mal estar e tilinta a campainha da ordem. Vereador Pereirinha Barata Timão pede a palavra. Faz um discurso gaguejado sobre o aniversário da avó e a coleção municipal de tampinhas que lhe valeu muito tempo de ociosa dedicação. “Mas avó é avó e só se tem uma!” Arremata. É aparteado com veemência por feroz opositor.
- Eu tenho duas!
Longe de poder conferir o horário num relógio ambos lutam para calcular o número de avós naturais variando a circunstância. O presidente interrompe a quizumba para dar lugar às questões de ordem. Marca uma reunião para o dia oito de abril. Uma importante reunião que tratará da “mudança do regimento interno” com “aumento de salário” significativo para a bancada. Todos concordam com anuência máxima, exceto Dejanira, eleita por se entregar as tradições míticas; ela quem se opõe com estrepitosa força verbal.
- Não será possível uma reunião nesta data!
-Por quê? Indaga o Presidente com tímida entonação.
- Bem, temos o “amigo secreto de páscoa”, organizado pelas asssitentes legislativas, o que muito nos sensibiliza...
A data da reunião para aletração do regimento desloca-se para o início da semana por motivo de páscoa maior.
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Na próxima semana haverá uma bancada com dedos lambuzados de chocolate e processos tingidos saborosamente.