O DEFUNTO "SEM TERRA"
Ela contava-me num desses bate- papos improvisados, que seu pai, agora viúvo, sempre fora muito ciumento.
Porém, era um homem duma caridade singular, o que amenizava o tal defeito.
Sempre que podia, socorria a quem dele precisava.
Não poupava esforços e ensinava a todos "nesse mundo, temos que nos dar as mãos , uns aos outros. É da lei!"
E certo dia, o vizinho morreu.
Sabem como é, morrer nem sempre é tão simples!-e muitas vezes trata-se de algo deveras burocrático E CUSTOSO... nesse mundo!
Ir "em paz" nunca foi tão simples também.... como pode nos parecer.
Fãcil é falar! E de fato não é a toa que hoje já podemos encomendar a festa do despacho do defunto...que, COM OU SEM GLAMOUR não é nada barata.
É um investimento como qualquer outro...
E aquele vizinho, não tinha bolso.
Morreu, sem sequer ter o "direito" de sair dessa...para outra mais em conta! Nenhum pedaço de terra , sequer batida, para acomodar o esqueleto cansado que pedia por outro mundo de preços mais módicos...
E foi aí que "aquele" seu pai tão caridoso não poderia ignorar o fato, resolvendo prontamente socorrer o defunto.
"Vizinho meu" é como meu irmão" disse ele para a filha!
Bem, se era como irmão... era família, então cedeu um espaço no jazigo familiar.
Tudo parecia bem resolvido!
Porém, para colocar o corpo na gaveta tiveram que tirar os ossos dos que , sossegadamente já moravam por lá.
Ossos de quem? Ora,da esposa falecida do pai caridoso...MAS CIUMENTO!
Foi alí que a caridade reclamou:
-Ah não, perto dela não!
-Mas pai, são só os ossos, temos que acomodá-los num cantinho...
-De jeito nenhum, "ela" com "ele" nunca! Isso não posso permitir...
E foi assim que a confusão estava formada.
A viúva...(a do defunto) explodiu mais ainda em prantos.
Como resolveram a questão? Deixaram os ossos num cantinho bem isolado, livre de qualquer "encosto", depois de muito convencer aquele ser tão ciumento...de que os ossos da "sua falecida" estariam protegidos do recém chegado corpo daquele defunto sem terra.
Só sei que a história me ensinou que até caridade tem limite.
E como sempre digo, taí um problema que não é comigo.
Dos meus ossos...que alguém dê conta!, ora essa.
Tô nem aí se eu for um defunto sem terra!
É o mínimo que peço a esse mundo...tão burocrático!
Que seja a parte a me caber..."neste latifúndio"...de tantos homens poderosos...porém nem tão caridosos asiim.
VERÍDICO.