Enivalda e Franilsson em " metrossexual"
No ônibus de volta a casa, Enivalda lembrava-se da conversa que ouvira de sua patroa com uma amiga:
- E como ele é?
-Ah, Marcinha! Ele é maravilhoso! Bonito, cheiroso, barba bem feitinha, educado, entende de vinhos... Você precisa ver, menina, cozinha melhor que eu! E é do tipo que capricha nas preliminares!
-Metrossexual...
Uma freada brusca fez a diarista voltar à realidade.Desceu do veículo amaldiçoando o motorista.
Entrou em casa carregando um pacote de pão francês quentinho.
Fritava alguns ovos quando Franilson, seu namorado chegou.Ele ia para casa dela às sextas-feiras e passava o final de semana todo lá.
Nem mal chegou, foi agarrando a mulher, que se viu obrigada a interromper seu serviço culinário e ceder às carícias lascivas do namorado.
Quarenta minutos depois, enquanto Franilson molhava lascas de pão na gema do ovo frito e tomava uma cerveja pelo gargalo, Enivalda o observava cheia de julgamentos: “não é educado, já chegou me agarrando; nem sabe cozinhar, devora pão com ovo; não entende de vinhos, tá todo suado e nem foi tomar banho depois de me amar, só faltava ser feio... mas não é inteligente”.
- O que foi, minha princesa? Tá me olhando com uma cara esquisita!
- Quer saber, Franilson? Cansei! Eu quero um metrôsexual.Vai embora daqui!
Ele saiu catando as roupas espalhadas no chão, vestindo-as sob os gritos da namorada.Pôs a mochilinha puída nas costas e foi embora.
No outro dia, por volta das onze da manhã, ele retornou ao barraco da amada:
-Passei duas horas vendo os metrôs na estação Sé e não vi nada de sexual.Você está com aquelas idéias de fazer bobice dentro dos trens?Eu topo!
Saiu de lá com dois quentes e um fervendo.
Aproveitou que a sobrinha adolescente estava em casa e resolveu perguntar a ela o que era, afinal, “metrôsexual”:
-Tio, é metrossexual e não metrôsexual. Se você me der um real, a gente pode pesquisar mais sobre isso na Lan House do Gleu.
Depois da pesquisa:
-Entendi!
Telefonou para a namorada pedindo uma nova chance, que seria um metrossexual dali para frente.Marcaram um encontro no shopping center.
Enivalda ficou muito feliz com o que vira: ele estava cheirando a Axe não a tres brut de marchand; a barba estava feita, o cabelo domado por gel e as unhas, mesmo cheias de cutículas, haviam recebido uma camada de base incolor:
-Hoje eu quero tomar vinho, Franilson, e você escolhe.
Estavam indo para a praça de alimentação, quando ele puxou a namorada pra uma saída e emergência e sussurrou em seu ouvido:
-Eu virei um metrossexual completo - afastando o cós da calça e mostrando a ela parte da calcinha de renda – eu tô usando aquela calcinha que eu roubei de você.O David Beckham usa as da mulher dele e o cara é o maior metrossexual da parada!Gostou?
-Seu boiola dos infernos! Não me procurei mais - furiosa.
Nova sexta-feira.Dia de faxina na casa de D.Juliana.Porém, dessa vez, a diarista encontra a patroa triste e não resiste à pergunta:
-Ô, Dona Juliana, que cara é essa? Semana passada a senhora estava tão feliz!
- Pois, é, Enivalda.Eu tenho um dedo podre pra homem.Descobri que meu namorado é bissexual, tô arrasada!
- Nossa! Esse homem é cheio das qualidades mesmo! Metrossexual, bissexual...Pior é o meu: barba por fazer, quer sexo toda hora, tem um cheiro de homem, tem um apetite que Deus me livre, não entende nada de vinho, usa calci...
- Não, querida, você entendeu tudo errado...
- Hã?Como assim entendi errado?
-Bem, esquece...Me conta mais desse seu namorado, vai?Barba por fazer, é?Que coisa!
(Maria Fernandes Shu – 12 de março de 2009)