Não ao fim das filas

Fila é um grande barato. Não entendo como podem não gostar e combater as filas. Eu confesso que gosto, muito. Entro em fila só pra conversar fiado, ouvir histórias e estórias. E como tem, das duas. É na fila que você faz o censo dos espertos. Sempre tem um tentando dar uma beiçada no bolso de alguém e, algumas vezes esse alguém sou eu. Cabelos e barba brancas, naquela idade de quem corre devagar. E, novamente, tenho que confessar. Eu ajudo, faço cara de ontem só pra ouvir os leros. A memória é boa e eu dou corda, gravando as partes boas. É muito engraçado ver como, apesar de a mídia televisiva e impressa viver ensinando como não cair em golpes, as pessoas insistem em cair na arapuca. É o esperto tentando dar rasteira no sabido. Nos contos de vigário a vítima só cai porque quer ser mais esperta e tirar proveito de uma hipotética fragilidade do sabido, que já conta com isso. Mas também tem os golpes inocentes, dados pelo mal caráter em princípio de carreira . Daí, o cara chega na maior cara de sofrimento e diz. _ Cidadão não quero vender nada nem quero lhe enganar a vossa pessoa mas é que eu to precisando de um pra passagem adonde eu vou pra uma entrevista de emprego. E eu vejo que a vossa senhoria é uma pessoa de boa cara e bom sentimento cristão; então eu lhe dou de presente esse relógio de estimação e vossa excelência me adianta 20 mirréis da passagem e do lanche. Ta de bom tamanho? Melhor fazer isso do que roubar, não é mesmo cidadão. E a minha cara de ontem fica de queixo caído com tamanha e sórdida humildade. Devolvo o relógio pro cara e adianto a vinte do cigarro - que ele já está encarando faz tempo - e digo. _ Vinte que eu tenho é esse, serve? O sujeito pega a guimba e saí sem um obrigado. Rio e fico esperando, porque tem mais. Ora se tem. Fila que se preza não tem calmaria, tem intervalo. É o tempo pro cara da minha frente me contar um caso parecido que aconteceu com ele e pra madame de trás rogar praga no pobre do malandro. Olho pra um lado, olho pro outro e finjo que a demora da fila em andar me aborrece. Desisto da fila e me despeço dos colegas. Saio cantarolando um sambinha e me mando pra fila da loteria esportiva. A mega acumulou, de novo, deve estar a maior fila e o maior buxincho - ou buxinxo?-. Me mando pra lá. Pra quem não gosta de fila, um alerta. A fila da vida é inevitável, você está nela...rssss.