MEU AVÔ CORDEIRO

Vô Cordeiro é um desses avôs queridos, gravados no coração da gente, que saem do chão para ir enfeitar o céu...Magro, alto, com todas aquelas cicatrizes trazidas pelo tempo na pele da qual poucos escapam, afinal essas harchuras que o tornaram avô. Mas sobretudo era portador de muito humor.

Ele gostava muito de conversar com as pessoas e como levantava muito cedo, ficava impaciente a andar pela casa, do quarto para o jardim, do jardim para o quarto.

Um dia minha avó Neusa acordou e ele estava no telefone. O relógio de parede marcava cinco e meia da manhã enquanto o seu pêndulo balançava incansavelmente de um lado pro outro.

Ouviu então ele conversando com aquela vozinha polida, suave, quase um sussurro, causando até um ciúmes na vovó:

- Meu amor, você pode repetir para mim o que disse.

Mais alguns segundos e ele acrescentou:

- Oh minha querida, sua voz é muito bonita, é muito suave.

E depois:

- Obrigada minha querida! Entendi direitinho, agradeço você ficar repetindo com tanta suavidade na voz, gosto de ficar te ouvindo!

Minha avó já a ponto de explodir, não acreditava no que estava ouvindo. Pensava na festa recente dos 50 anos de casados. Tinha sido uma Bodas de Ouro tão linda! Como ele podia estar fazendo aquilo agora. Então não aguentou e perguntou em um tom raivoso:

- Cordeiro, me diga! Com quem estás falando?

E ele respondeu:

- Calma querida! É com aquela moça educada que informa a hora pra gente. Mas ela pensa que eu não escutei. Ela fica repetindo a todo instante. É tão paciente, educada e atenciosa!

A vovó só relaxou quando pegou o telefone e escutou repetidas vezes a gravação do 130 que informa a "hora certa".