Homo Erectus

Como diria vovó, “quem mora em submarino, não dorme de janela aberta.” Mas isso não tem nada a ver com essa história.

***

No final da última semana, painho comprou uma mesa nova para o meu PC e deixou agendada a visita do montador para esta terça.

Hoje de manhã, eis que bate à porta do pensionato onde habito uma moça, de no máximo 35 anos, trajando um macacão branco, decotado nos seios, com uma logomarca de movelaria estampada no mesmo lugar. “Sou a montadora”, disse ela, com o olhar mais cativante do mundo e com uma vozinha sexy bagaramba, que lhe subtraía pelo menos dez anos na idade. Não precisa dizer que a conduzi até o meu quarto todo serelepe, satisfeito por ser ela ao invés de um velho barbudo e fedorento à cachaça. De vez em quando ainda dava umas olhadas para trás e dizia “bora, moça!” =D

E a moça vinha, em câmera lenta, provocante como ela só. Juro que em alguns momentos pensei em chamá-la para casar, mas seria sorte demais se ela dissesse sim. Preferi ficar apenas nas fantasias. No final do corredor onde fica o meu quarto, parei, abri a porta educadamente e esperei a moça chegar, sem conseguir tirar os olhos da sua bela logomarca. Quando ela passou por mim e entrou no quarto aquele cheiro suave de alfazema com serralheria invadiu o meu coração, ressuscitando um sentimento que nunca existiu a não ser em outras vidas. Na cama do lado oposto do quarto, meu estimado companheiro de cela dormia, assustadoramente nu.

Onde está?, ela falou. Logo ali, apontei. Essas foram as únicas palavras que trocamos pelos quinze minutos que se sucederam até que ela tivesse executado o trabalho. Na verdade pensei em falar mais, em oferecer ajuda, segurar os parafusos (ou os seios dela), mas cada vez que ela se mexia, meu pomo-de-adão parecia que ia saltar fora, de tão nervoso que eu ficava. Por isso, enquanto ela fazia o serviço, eu apenas prestava muita atenção, afinal de contas, era meu sonho de criança aprender a montar um móvel. =P

Mas, Jesus, quando ela pegava a furadeira e punha as brocas, girando devagarzinho... Quando olhava para mim com aqueles olhinhos pretos que nem a noite, ah, nesses momentos eu faltava pôr os bofes para fora de tanta emoção. Só vocês vendo para compreender.

Até que no final, quando a mesa estava prontinha, charmosamente posta no canto quarto, ela virou-se para mim e falou:

- Você já faz faculdade?

Caro leitor, quem disse que eu consegui responder alguma coisa? Quando abri a boca, o único som entendível que saiu foi um “Eh”, totalmente sem graça. Ela sorriu.

- Tão novinho... Em que curso você ta?

- Jornal - engasguei - Jornalismo...

- Ai que lindo! Coisa de intelectual. Queria que meu filho fosse esperto assim.

“Meo, ela tem um filho da minha idade!”

- Pronto. Agora deixa eu ir, que ainda tenho uns três para montar só hoje de manhã.

“Ah, não - pensei - por que ela tem que ir? Por que não desmonta e monta de novo? Não tem problema, eu adoto o seu filho. Eu crio ele. Boto ele na facul, mas não vai não, por favor!”

Mas ela não lia pensamentos. Virou-se, foi até a porta, e eu tive de acompanhá-la, mortalmente desiludido.

Meu dia estava acabado. Estava deixando a mulher da minha vida escapar por entre os dedos, e ir embora como um sonho bom, que nunca é duradouro o bastante... Seguimos em silêncio até a porta de saída e lá nos despedimos com um breve aceno de mãos. E eu nem cheguei a tocá-la...

***

Agora que ela se foi, e que meu quarto ficou encharcado de feromônios, o móvel continua ali no canto, imóvel, silenciosamente me chamando de frouxo. E eu, erectus a mais de meia-hora, escrevo este texto rapidamente, doido para ir logo até o banheiro, cometer mais um holocausto.

* Baseado em fatos reais.