O animador de velórios

O Jaguará foi chamado em União da Vitória para animar o velório do rico comerciante libanês Kaled Ayub. O guardamento foi concorrido, e não só porque o velho era muito estimado: na região é grande a colônia libanesa, tendo lá nascido o falecido deputado Aníbal Curi, o poderoso “Buda” da política paranaense.

Jaguará sempre atendeu com prazer os chamamentos das famílias libanesas, por causa da culinária servida durante o transcorrer das lamentações: carneiro, tabule, kibe, quem há de resistir? Naquela noite, o animador foi recebido com uma amigável garrafa de “arak”. Abancou-se junto a alguns velhos patriarcas e, assim que uma boa platéia se formou na cozinha, o Jaguará começou a rememorar o falecido:

- Conheci muito o nosso saudoso Ayub. Homem sábio, de lógica árabe. Lembro que certa feita um tal de Luiz Fuinha parou o caminhão na frente da lojinha do Ayub e perguntou:

- Seu Ayub, tenho aqui um caminhão de arroz sem nota. O preço é a metade, o senhor aceita?

Ayub aceitou. Virou-se para o primogênito Kaledinho, que aqui ao lado não me deixa mentir, e pediu:

- Filho, vai na esquina e se abarecer biscal vem correndo avisar babai!

Começaram a descarregar o caminhão e, no meio, apareceu Kaledinho:

- Bábai!... Biscal vem vindo!

“Bára tudo e volta a carregar!”, gritou o nosso querido Ayub. Chegou então o fiscal, com uma pasta grande na mão e com a outra tirando a poeira do paletó:

- Venda grande, não é seu Ayub?

- Sim senhor! Melhor venda do ano que Ayub fez!

O fiscal levantou os olhos, passou em revista a sacaria e voltou à carga:

- Isso aí tem a nota, seu Ayub?

- Ainda não tem nota borquê Ayubá esberando carregar bra ver quanto mercadoria enche carroceria do caminhão. Daí, Ayub tira nota!

- Não pode! A nota fiscal tem de ser emitida antes de carregar!

Ayub coçou a cabeça e, súbito, ordenou ao filho:

- Ah! Kaledinho, então bára tudo que Ayub não quer broblema com receita! Volta descarregar tudo do caminhão e manda guardar lá dentro do debósito!

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O filho Kaledinho, com um discreto sorriso, confirmou a história. E lembrou outra do velho: “Um dia perguntei bra babai bra que servem os dedos da mão. Babai disse: Este polegar é brá apontar brá cima e dizer que está tudo bem. O indicador é bra apontar bra alguém e dizer bra cliente que ele está devendo bra firma. Este dedo médio é o dedo do prazer. Este outro, o anular, é bra botar um anel bem bonito. E este pequenino dedo mínimo é brá coçar o ouvido! Entendeu, filho? "

Então disse pra babai que só não entendi brá que serve o dedo do prazer. Ele me respondeu: Esse é o dedo bra apertar o botão da caixa registradora, filho! "