O HOMEM DO PEITO DE FOGO
O caixão, banhado pela luz pálida da lua, parecia caminhar sozinho entre quatro sombras. Uma fila de sombras indefinidas acompanhava o morto encerrado naquela urna de cor indefinida, e murmurava algo em coro que mais parecia uma exortação diabólica. De repente o cortejo estanca.
A lua foi encoberta por uma espessa nuvem negra escurecendo totalmente a estrada de terra que terminava na porta do cemitério. Silêncio total. As sombras se movimentavam como se estivem sendo agitadas por um vento misterioso.
As quatro sombras quebraram o silêncio entoando um canto lúgubre que parecia sair das profundas cavernas do inferno. Depuseram o esquife. A tampa do caixão foi se abrindo lentamente. Uma fumaça negra e fétida começou a subir na direção do céu.
O canto das sombras aumentou de intensidade a ponto de espantar as corujas e os morcegos que moravam nos ciprestes do cemitério. A tampa do esquife continuava lentamente a se abrir. Pequenos pontos luminosos saíram junto com a fumaça e se dirigiram para o cemitério por cima do alto muro branco.
Uma mão saiu da abertura da tampa do caixão fazendo sinais para as sombras. Elas se juntaram em torno do esquife. O canto continuava.
De repente se afastaram e se pôde ver a criatura que estava deitada com uma mão para fora. Um homem de barba, longos cabelos emaranhados, olhos de fogo muito abertos, boca escancarada mostrando dentes pontiagudos como se tivessem sido afiados.
O homem ergueu a cabeça, que girava como um ventilador, e disse algumas palavras com voz cavernosa ecoando fora e dentro do cemitério, fazendo tremer todos os que estavam enterrados.
Uma perna foi posta para fora do caixão. As sombras se curvaram em reverência. Depois a outra. O homem sentou-se dentro do caixão. As sombras ficaram silentes. O homem, erguendo-se, saiu do esquife.
Ficou ali, parado ao lado do caixão, com a cabeça girando. Os pontos luminosos voltaram e se acumularam em torno dele. Finalmente a cabeça deixou de girar. Ele apontou o dedo magro e longo para uma das sombras. Ela se aproximou, curvando-se em sinal de respeito.
Assim ele fez com mais algumas sombras até ficar rodeados por elas.
Ele escolheu, entre as sombras, uma que parecia ser uma mulher de grandes peitos e bunda volumosa. Depois disso, ele abriu os braços e do seu peito saiu um fogo parecido com lava de vulcão. As sombras murmuraram um “ó” que fez tremer o chão da estrada.
A sombra feminina elevou-se no ar e deu uma risada estridente. Seus cabelos se eriçaram como se estivesse sendo eletrocutada. O portão do cemitério abriu com um estrondo. Tendo a frente o homem com o peito em fogo, o cortejo entrou no cemitério. Em frente ao cruzeiro do campo santo, o morto parou e disse:
- Pessoal! Michael Jackson! Thriller!
As sombras jogaram o caixão para um lado e, acompanhadas pelo homem do peito de fogo, “arrasaram” dançando no cemitério.
“Ocê tava pensando u quê?”
26/06/08