Ao meu Querido Mestre Tio João
Eu devo ser uma criatura privilegiada, pois, se ao longo da minha vida, vi sonhos não se concretizarem e aspirações não se realizarem, por outro lado, encontrei sempre as pessoas certas na hora certa.
Quando entrei na Cia Mogiana, na carreira das locomotivas, fui buscar conselhos e orientações com o Tio João Gardinali que havia sido maquinista lá, e dos mais lembrados por todos como um homem exemplar, tanto na parte de conduzir um trem, como na parte moral. Muito compreensivo, muito calmo, e de um coração aberto a todos.
Quantas vezes, desde o meu tempo de criança, eu recorri a ele: dor de dente, dor de cabeça ou qualquer outra coisa que estivesse perturbando. Era só chegar na casa dele, que ele dizia: “Isto é canja para o Palestra”. E fazia um passe espiritual, colocando a sua mão direita na minha cabeça que as dores desapareciam. Ele era uma potência espiritual. Bastava que chegássemos perto dele para sentir vibrações positivas. Quanta gente recebeu de suas mãos a cura de males materiais e espirituais. Jamais deixou sair alguém de sua casa sem um reconforto e orientação. Distribuiu o amor sem olhar a quem. Era uma fonte de luz que todos podiam receber a sua claridade. Enfim, era um enviado de Deus entre nós.
Quando eu, já homem formado, a seu convite passei a freqüentar as suas reuniões espirituais pude presenciar toda a sua força, bondade, conhecimento e uma grande vontade de ensinar.
Quantos médiuns começaram com ele, inclusive eu. Muitos não seguiram os seus ensinamentos e se perderam pelo caminho.
Mas um dia ele partiu, deixando, a todos aqueles que o amavam, muito tristes. Como ele nos ensinava que não deveríamos lamentar aqueles que partiam, eu tive de contrariar os seus ensinamentos e chorei muito a sua falta. Sei que ele perdoaria a minha fraqueza, pois não tinha a estrutura espiritual para suportar tamanha perda.
Então, passado um ano desde a sua partida, eu fiz estes versos, sem grande valor poético, mas que saíram de um coração agradecido. Por isso no começo desta crônica eu disse que era uma criatura privilegiada. É a pura verdade. Qual o privilégio maior do que ter convivido com meu saudoso, querido mestre Tio João.
Ao meu Querido Mestre Tio João
I
Um ano desde a sua partida
Como a sua ausência é sentida.
Mas não nos deixou sozinhos
Você nos ensinou caminhos
Onde ir é como chegar.
Tio, Avô, Mestre, Presidente.
Nos ensinou a ser gente.
Instruiu-nos como amar,
Às vezes, contra a sua vontade.
Aperta-me grande saudade,
E sinto que vou chorar
II
Monumento de bondade
A sua felicidade era repartir, era dar
Com as mãos abençoadas
Eu vi em muitas jornadas
Delas fluir o amor.
Orientava o perdido, consolava o aflito
Ia buscar no infinito
Remédio para toda a dor.
Com suave autoridade,
Pois nos seus olhos trazia serenidade,
Chamava-me a atenção:
Afaste-se do orgulho, da vaidade.
E dessa grande verdade
Hoje eu lembro com emoção.
III
Humildemente chegou.
Foi no deserto uma fonte,
Que tanta sede aplacou.
De Deus esteve a serviço,
E sei que foi por isso,
Que mansamente o levou.
Fui seu discípulo, por sorte.
Mas como você não sou forte
O senhor ainda vai me ensinar.
Dos seus ensinamentos, tenho saudades,
E contrariando sua vontade,
Às vezes tenho de chorar.