Os Meninos de Dona Lourdes
À Lourdes Xavier
...Era o último dia do ano de 2005, e quase a meia-noite eu estava ali, debaixo daquela árvore, sem muitos motivos pra comemorar.
- "Ano novo, novas esperanças!" Gritavam todos que passavam na rua bem a minha frente, mas eu não estava lá de bem com as minhas esperanças.
Naquela noite estava sozinho e sentei na beira da calçada, vendo os carros passarem apressados. Teria seguido em frente, não fosse a gritaria de um grupo de meninos, que passaram por mim e entraram numa casa, que ficava logo adiante.
Em seguida, outro grupo de crianças entrou na mesma casa, e um outro mais. Pela alegria e sorriso em seus rostos, deveriam ter mesmo muitos motivos pra comemorações e decidi entrar com o grupo seguinte, pra entender o motivo daqueles sorrisos...
Ninguém notou minha presença. Todos pareciam ser bem vindos. Contei uma a uma às crianças que lá estavam. Trinta no total; a maioria sentada no chão mesmo, com seu prato de refeição ao lado.
Comiam com tanto prazer e com tanta alegria que, aquele prato de comida parecia ser o único alimento do dia.
Meia-noite em ponto surge Dona Lourdes por aquela porta, acompanhada por sua única filha. O sorriso das crianças tornaram-se ainda maior com sua presença. Mesmo um pouco adoentada, estava ali para dividir sua alegria com os meninos.
Perguntei a uma das crianças a razão de estarem todos ali reunidos. Disse-me que Dona Lourdes oferecia uma refeição, no final de cada dia, às crianças pobres, que muitas vezes moravam na rua, e fazia isso em sua própria casa.
Sentei no chão juntos com os meninos e fiquei observando aquela senhora com os meninos ao seu redor.
Veio-me em mente a história do jovem que acordava cedinho todas as manhãs, pra devolver ao mar as estrelas lançadas na areia por suas ondas.
Fazia o mesmo todos os dias, mesmo sabendo que eram quilômetros sem fim de areia. Quando lhe perguntaram das suas razões, visto que sozinho não mudaria nada; respondeu que para cada estrela lançada de volta ao mar, faria toda diferença e estava ali apenas fazendo a sua parte.
Entre o jovem da praia e Dona Lourdes, havia uma enorme diferença de idade, mas eram exatamente iguais nos seus sentimentos.
Naquele dia, sai dali um pouco diferente e um sorriso inesperado teimava permanecer nos meus lábios.
Estava alegre, por mim mesmo e pelos meninos.
Aprendi que se não podemos mudar todo o mundo a nossa volta; podemos sim começar mudando o que existe dentro de nós!
À Dona Lourdes o meu reconhecimento.