A Vizinha

Apenas três casas separam a dela da dos meus pais. Apesar da pequena distância, não tinha o hábito - salvo quando levava um pouco de Coalhada à pedido de minha mãe - de frequentar a casa de Juscelina. Raramente a chamavam pelo nome de batismo. Era Cesinha , Cigana, Ju ou Dada, esse último usado por sua afilhada.

Entregava a encomenda e retornava escutando um " obrigado " seguido de um " depois eu mando a vasilha. "

Somente no período que namorei sua sobrinha é que minhas idas, ainda que rápidas, passaram a ser mais frequentes. Quase todo dia, quando aproximava o fim do meu expediente no Supermercado Família Teixeira , recebia uma mensagem ou uma ligação:

- Nego, tô aqui em Ju te esperando...

Encontrava o carro preto na porta e as duas na sala, sentadinhas no sofá, conversando, dando risadas e as vezes cantando e escutando suas músicas, numa cumplicidade tamanha.

Aos poucos, fui entendendo e admirando aquela relação de amizade e amor que uma depositava na outra.

E o que eu mais ouvia, era essa afirmação:

- Cesinha ajudou muita gente !

Com esse amor ao próximo, seguiu o conselho do Pai Celestial "... todas as vezes que fizestes isso a um dos menores de meus irmãos, foi a mim que o fizestes. "

A sensação, com o diagnóstico da sua doença, é que a cada dia, semana , mês, estávamos perdendo- a.

No cortejo, além dos entes queridos e amigos, suas músicas, as que haviam pedido em vida , acompanharam-a até a entrada do cemitério.E foi lá, que senti um aperto no peito, quando vi Lora, a sobrinha dela que a tinha como uma filha, aproximar do túmulo alto, com uma rosa na mão, jogar dentro, encostar a cabeça na casinha de cimento, ainda aberta, e aos prantos, perguntar :

- Pq tu me abandonou , Ju , pq?

Um Violonista tocou aquela bela canção "Aleluia". Mas antes, perguntou se alguém queria falar alguma coisa.

- Eu quero. Era Fátima, a Caçulinha das netas de Cesinha, com o dedinho indicador apontando para o céu.

E quando pediu que falasse, ela, com uma carinha de saudade e voz embargada, disse:

- Eu não sei.

Naquela hora, lembrei da pergunta feita por Lora e encontrei a resposta : É verdade. A gente não sabe de nada, mas Deus sabe de todas as coisas.