Vaqueiro Antigo

Zelador distinto, sem pareia

Conserva linha tradicional

Corre no mato, laça, arreia

Embrenha-se bem no matagal

Corajoso, com sangue nas veias

Compromissado, forte e leal

Madrugada o campo explora

Recantos, trilhas, gado mugindo

Passeata, costume, labora

Na estrada, amigos reunindo

Na volta tem que ter história

Melhor escoltado que sozinho

A casa de taipa como morada

Conhecida como pau a pique

Num pedaço de terra doada

Aproximando um xiquexique

Do curral o berro da boiada

Condição clara desse Recife

Na mesa aos semelhantes se junta

A mulher sonha em ser senhora

Os filhos cansados da labuta

Partidos entre a lida e escola

Ninguém fala e ninguém escuta

Solidão comum logo se aflora.

No teu cavalo, leve, maneiro

Problemas somem da memória

Galopeando, fica inteiro

Curtindo a brisa dessa hora

Com o cachorro no estradeiro

Cavalgando feliz à aurora

Reunião diz o dono rico

Chegou o tempo da partilha

Os mijolos, nascidos e morridos

Faz entender e, ninguém desconfia

Sadios e doentes, sumidos

Conta precisa, com maestria

Um bezerro ou meio garrote

Logo o ordenado recebeu

Negocia o que veio de sorte

O caderno o chefe floresceu

Reza ali pedindo norte

Ânimo e desalento, meu Deus!

A profissão não rende dinheiro

As vestes são simples, acanhadas

Vive da dedicação, apego

Contente com a invernada

Sem perneira, gibão, nem arreio

Tendo fé na Virgem Consagrada

Infeliz, não se apequena

Puxa conversa com sua parceira

A criançada toda serena

Novidade o grupo anseia

Esperança brotou na morena

Luz a família saboreia

Num instante a dama viajou

A cama de Sinhá Vitória

Como Graciliano desenhou

Animação grande, notória

O imóvel todo mobiliou

Contentamento, paz e glória

Decidido lá foi se demitir

Mais crédito o patrão propõe

Tudo na mente volta a surgir

Agonia, momento tristonho

A fé dos herdeiros instruir

Adeus para o tempo risonho

Viver duro esse de Vaqueiro

Tem garra e palavra, se cansa

Indo e voltando, sem terreiro

Das alegrias que têm, só dança

Ofício sem valor financeiro

Nada teme e nada alcança

Desse boiadeiro só a saga

Poucos têm raízes como você

Quando surgem pelas cavalgadas

Diferentes nas roupas e no ser

Trocam tudo pelas noitadas

O sentido de peão não quer saber.

A chuva veio resplandecer

Mudanças chegam sem pestanejar

Chance do sertanejo renascer

Um pedaço de chão vai plantar

Novos planos para desenvolver

Autoestima ressignificar.