NINA

 

Toda quinta-feira ela chega para trabalhar. Não falha. Só deixou de vir no último mês de gestação de seus dois filhos, Ana Cláudia e Eduardo. Mesmo assim, não nos deixou na mão. Suas irmãs, Francisca e Neide, vieram substituí-la.

 

Com Nina, cujo nome verdadeiro é Raimunda, não temos somente uma relação de trabalho. É mais que isso, há amizade e confiança, e nunca houve nenhum conflito entre nós.

 

Quando minha idosa mãe deixou sua casa e veio morar conosco, Nina ajudou a cuidar dela. É diarista e não enfermeira, mas fez as vezes de. Não chamava minha mãe de Maria, mas de vovó. E ela e as irmãs nos acudiram quando mamãe ficou ainda mais debilitada, necessitando de redobrados cuidados. De nossa parte, também procuramos retribuir a atenção que nos dispensa, mostramos nossa gratidão para com ela e família. Carlos, seu marido é nosso fac totum, nos auxilia quando uma torneira vaza, o interruptor não funciona ou algum trabalho de pedreiro se faz necessário. É mestre de obras, e dos bons.

 

Às vezes, Nina chega com um pacote de pão francês ou pão de queijo fresquinho para o café da manhã, e quem diz que aceita reembolso do que gastou. Fala que dinheiro não é tudo na vida e que há coisas que dinheiro não compra. Há uma troca, às vezes leva para casa parte de um bolo ou um pote de doce de abóbora que faço em casa. Seguramente, há mais de trinta anos que nos ajuda com o trabalho doméstico.

 

Nasceu em Juazeiro do Norte, terra de Padim Ciço, no Ceará, e veio ainda criança, fugindo da seca, com a família, para o norte do Paraná onde trabalharam nas plantações de café e algodão. Mais tarde, a família mudou para Curitiba, com seus oito filhos, onde as moças passaram a trabalhar como domésticas e os meninos na construção civil. Aqui melhoraram de vida, adquiriram casas próprias, carros e outros bens. Nina frequentou pouco a escola, bem como seus irmãos. É uma diarista para a qual nunca faltou trabalho por ser muito correta, honesta e trabalhadeira. Além disso, tem personalidade conciliadora, cordata, calma e alegre.

 

No último mês de julho viajou pela primeira vez de avião para a terra natal. De lá veio contando que quase não reconheceu o local que deixou há cerca de 40 anos. Disse que não viu seca, estava tudo verdinho, mas só mato. Nada de plantação, horta, roçado. Culpou o Bolsa Família e a migração dos jovens para o sudeste e sul para trabalharem na construção de prédios. Viu muitos idosos, aposentados, na zona rural, de onde veio. Nenhum jegue. Na cidade, ficou espantada com a presença de tantas motocicletas, até mototáxi existe. Mas não se conformou com a falta de capacetes. "Ninguém usa e a polícia não multa". “Dona Maria, aqui no sul se respeita a lei”, me disse.

 

Seu filho, Eduardo, está prestes a terminar o curso de engenharia civil em faculdade particular, que ela paga com seu trabalho. Sempre a incentivamos a dar aos filhos o estudo que não teve. Me emociono ao ver essa nova geração galgar um lugar mais alto na pirâmide social, graças ao trabalho árduo de seus pais.

 

Esse é o Brasil que dá certo!

 

 

 

Aloysia
Enviado por Aloysia em 07/10/2024
Reeditado em 07/10/2024
Código do texto: T8168057
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