VOLTA FÊNIX
Um dia você foi descartada como lixo dentro da Universidade, prestes a ter filhotes.
O seu cansaço e sofrimento eram explícitos e a sua tristeza imensa.
Você estava perdida, sem saber o que fazer, e procurava só um cantinho para os seus filhotes ao mundo chegarem.
Quando se é gente, você fala, grita, esperneia. Mas, quando se é um cão, só se tem o olhar para falar.
Um olhar de muito sofrimento e dor, de quem não sabe com palavras se expressar. De quem não sabe contar a sua história.
Quem sabe o que já haviam feito a você no passado, como te criaram. Quanta fome e necessidade você deve ter enfrentado.
O teu pelo avermelhado e branco, apesar de belo e espesso, parecia nunca ter sido cuidado.
E então, a tal pessoa que se diz humana, que te criou sabe-se lá por quanto tempo, e a quem você deveria ser muito fiel, pois sempre demonstrou uma bondade e carinho imensos; esse humano, enfim, te vendo prenha, já que não teve a consideração de tentar te castrar; talvez até abrisse a porta todo dia pela manhã para que você fosse procurar seu alimento na rua e fazer as suas necessidades, sem pensar no que poderia te acontecer na rua, quais doenças poderia pegar e quantas mais maldades alguém poderia te causar; essa pessoa te levou para a Universidade e lá te jogou, sem se importar se alguém cuidaria de você e dos filhotes, se sobreviveriam.
Uma alma perdida, tem vendo sofrer, te deu uma caixa para você parir.
E os teus bebês vieram ao mundo, dentro daquele invólucro de papelão, sem nenhum cuidado ou atenção.
Mas, você não estava totalmente invisível, pois as suas súplicas de abandono e necessidades chegaram aos ouvidos do Projeto, que mesmo sem ter condições de acolher um novo cão, entre tantos largados naquele lugar, se prontificou a mandar te resgatar.
Infelizmente, antes do resgate, alguém ainda te bateu com um automóvel, pois as pessoas pensam que dirigem sozinhas, que não existem animais ou transeuntes pelas ruas da Universidade.
Enfim, o socorro chegou e você foi levada com carinho, juntamente com os seus bebês para um lar temporário, que te deu um cantinho confortável e quente, água e comida. E lá, tranquilamente, você pode iniciar a sua nova jornada de mãe.
No entanto, pela manhã estava coberta de sangue, uma hemorragia havia tomado conta de você, provavelmente como consequência do atropelamento.
E mais do que depressa, uma clínica veterinária abriu as portas para te atender de urgência. Você foi levada com os seus pequenos bebês e operada às pressas.
Graças a Deus e a veterinária que te atendeu, tudo correu bem. E logo pode retornar com os bebês para o lar temporário.
E foi assim, que ganhaste o nome de Fênix, renascida das próprias cinzas.
Naquele lugar, finalmente, te enxergavam. Você recebeu muito carinho e atenção. Várias refeições por dia para que tivesse energia para se recuperar e amamentar os bebês. Foi medicada e muito amada.
Os dias se passaram, e todos os cuidados foram tomados, e logo você e seus filhotes estavam felizes e correndo por todo canto.
Mas, o teu olhar era sempre muito sofrido. No corpinho tão pequeno e frágil, muitas cicatrizes você carregava. Ferimentos antigos, que deixavam aberturas em seu pelo macio e reluzente.
Você pedia tão pouco, só um carinho e atenção. Era tão doce e meiga, se atirava para qualquer um. Um poço cheio de amor para dar e receber.
Logo o tempo passou e os seus belos bebês foram adotados, todos foram para bons lares. Mas, você ficou à espera de um lar só seu.
Por muitas vezes, pensei em ficar contigo, pois o teu olhar era profundamente sofrido e nem assim, você adquiriu qualquer maldade neste mundo.
Infelizmente, a parte financeira e o ciúme explícito de uma de nossas cadelas, não abria espaço para te acolher para sempre. E isso, me causa um imenso sofrer, uma dor sem tamanho.
E continuastes para adoção. Foi para várias feiras e anunciada muitas vezes na página do Projeto, no entanto, as pessoas não querem cães adultos, porque acham que um filhote vai crescer e será mais educado de acordo com a família que cresce.
Grande engano, o cachorro adulto, tem a sua personalidade formada e é muito grato a quem lhe proporciona um lar.
Ele é fiel, amigo, companheiro e faz tudo por você. Ele te ama incondicionalmente e é capaz de morrer por você.
O seu olhar só pedia uma chance de ser feliz para sempre, e isso doía demais. Porque as pessoas te olhavam, falavam o quanto era meiga e bela, mas não te queriam. Esse desprezo preconceituoso, me deixava imensamente triste.
E você ficava lá, na porta da cozinha. Sempre que abríamos, era a primeira que a gente via. Você cuidava dos outros filhotes que chegavam para adoção e brincava com eles.
Pulava e se entregava como ninguém. Era tão maravilhoso te olhar, ver quanta felicidades poderia dar para alguém.
Um dia, fomos avisados que alguém queria te adotar, e ficamos tristes que ia embora, mas felizes que teria um lar só teu.
Você foi vacinada e a pessoa veio te pegar, e você pulou em cima dela e agradeceu. Porque, essa era você, só amor e bondade.
E no dia 29 de maio de 2022, a pessoa te levou e prometeu que serias feliz e nunca mais sofreria.
Dia 30, entrei em contato e pedi notícias suas, e a pessoa ficou de mandar fotografias mais tarde. Disse que você estava muito feliz e era uma cadela excelente, super tranquila e amorosa. E é claro, que eu já sabia, pois, essa era realmente você.
As fotografias não vieram, retornei a mandar mensagens sem resposta. Somente no dia 07 de junho, a pessoa me informou que você havia fugido no dia 30 de maio e ela havia te encontrado na padaria em frente à casa dela. Logo depois, a pessoa te prendeu e você conseguiu fugir de novo, mas continuou na rua dela. E ela novamente te amarrou e saiu.
Quando retornou para casa, só encontrou a corrente e a coleira vazias.
Não soube se você fugiu ou se alguém a soltou por pura maldade, ou quem sabe te levaram para longe ou deram cabo de ti (não quero nem pensar nessa ideia, pois o meu coração aperta demais de tanta dor).
A pessoa disse que resolveu te procurar e espalhar cartazes seus nas proximidades da casa, mas não obteve nenhuma notícia. No entanto, não soube como nos contar e guardou esse sumiço até o dia 07, quando enfim me contou e desde então sofro profundamente.
Já te procuramos por todo canto, espalhamos cartazes, publicações nas redes sociais e até foi oferecido uma recompensa, e você não aparece.
O meu coração cada diz fica mais triste, e todos nós só queremos que esteja bem, que nada tenha acontecido a você. Rezamos todos os dias para alguém ligar e dar notícias suas.
Procuramos pelas ruas, por todo lugar que andamos, por você incessantemente.
Você nos deixou um vazio e uma dor imensa. E não está passando.
A dúvida de não saber o que aconteceu com você, só nos deixa mais e mais tristes.
Não tem um dia que eu não te procure do lado de fora de casa com a esperança de que retornes.
E só peço a Deus: Volta Fênix!!