Momentos de Poesia

Não me peçam pra dizer a data, não saberia dizer ao certo. Sei apenas que foi por volta de 1980. Havia um colega de trabalho que tinha o dom precioso de recitar poesias. Gostei tanto de uma delas que pedi-lhe que a copiasse para mim, e a tenho até hoje, um papel amarelado pelo tempo, onde algumas palavras já começam a desaparecer. Procurei na internet para tirar algumas dúvidas e a princípio não achei, ele havia mudado o título de EULÁLIA para ROSA DE MAIO. Vou compartilhá-la com vocês. Espero que gostem.

EULÁLIA

Deixei-a solitária por uns dias,

Enquanto melhorava do ciúme,

E saí pra evitar muitas porfias

Que entre nós se davam de costume.

Nesse tempo eu andava arruinado...

E as brigas entre nós, frequentemente,

Transformavam a abelha do passado

Numa aranha de dor sempre presente!

Então o inseto que fazia, outrora,

Mel de carícias na feliz colmeia,

Vinha fazendo entre nós dois, agora,

O fel da vida - numa horrível teia!

Corri mundos, andei por terra estranha,

Procurando renúncia, esquecimento...

Mais, dia-a-dia, se infiltrava a aranha

Na teia enorme do meu pensamento!

Mandava-lhe presentes de onde estava,

Escrevia-lhe cartas carinhosas

Pedindo que esperasse que eu voltava

E novamente nasceriam rosas...

Mas, uma noite, triste noite, amigo,

Eu entrei num cassino, que amargura!

Ah! Não chores de ouvir o que te digo

Nem te rias da minha desventura!

A sala estava cheia de cinismo

Dos que, no vício, vão matar a sede...

Era um antro de fumo e alcoolismo,

Com visões sensuais pela parede!

Um perfume de bétulas e sândalos

Recendia da carne e sedas finas,

E a luz envergonhada dos escândalos

Parecia tremer sob as cortinas!

A dona do cassino, a abelha-mestra

Do cortiço infeliz, torpe e devasso,

Dava bebida aos maganões da orquestra

E mandava agitar sempre o compasso...

Enquanto os instrumentos gargalhavam

Na frivolência do pagode insano,

Eu distinguia as notas que choravam

Nas cordas ultrajadas de um piano!

Mais tarde, era o intervalo do pecado...

Enquanto a orquestra demorava o ensaio,

A pianista curvando-se ao teclado,

Dedilhava a canção Rosa de Maio...

Era aquela canção - quando partimos -

A que Eulália tocava todo o mês...

Pois foi no mês de maio que nos vimos,

Eulália e eu - pela primeira vez!

Recordação, saudade, sofrimento...

Aproximei-me sem saber por quê...-

Era Eulália que estava no instrumento!

Sim, Eulália... vestida de "soirée"!

Quando me viu, eu vi também seu vulto

Afogar-se nas brumas de um desmaio...

E até hoje em minh`alma um piano oculto

Vive sempre a tocar Rosa de Maio!

Rogaciano Leite

Jota Garcia
Enviado por Jota Garcia em 10/05/2022
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