Motorista do mundo
Girar rodas com vidas,
dirigir outras muitas vidas,
E nos seus giros esquecer
Sua única e própria ferida
E o que fazer sem direção
Pra evitar essa contramão
Girar o volante, a roda e a vida
A ambulância que salva
O caminhão que transporta
O combustível que gira
Gira muitos outros carros
Mas nem servir girando
Evita a língua ferina
Mesmo na caridade
E doando o pouco real
O bom motorista gira
Na contramão do mundo
A estrada direita dos outros
Na mão dos terceiros
Com braço e afago ligeiro
De câmbio sempre fagueiro
De um sim, carona certeiro
Teresina vou sempre já
Picos, é um pulo pra lá
Aripipina, meu pai
Enxergue limpo, igual carcará
Aracaju não é distante
O longe sempre foi outro lugar
Que agora dirigi pra lá
Fui longe, minha mãe
Cheguei longe, meu pai
Dirigi diferente, mas nunca pra trás
E nos deslizes, entendam
Dirigi sempre mais
Se foi no outro sentido
Perfeito só Deus pai
Dirigi para os amigos
Guiei bem os meus pais
Dirigi muitas vans
E até carros a gás
Se no álcool eu perdi
O melhor da minha paz
Minha essência mantive
E o sentido de comunidade
Foi o que importou, meu pai
Dirijo em outros planos
Na terra, isso não vale mais
Mas ainda sim dirijo,
e no longe, passeio fulgás
Sei que não esquece, mãe
Mas lembre com alívio
Pois agora estou em paz.
Homenagem ao primo Josélio, motorista profissional, falecido em janeiro de 2021.