MISSIONÁRIO VICENTINO QUE PARTE
“Não sei quem é mais carente, o pobre que pede pão ou o rico que pede amor”
São Vicente de Paulo
A notícia do falecimento do irmão vicentino João José de Lima, em 3 de outubro, comoveu a todos nós, os bezerrenses, os que tiveram a oportunidade de conhecer o homem gentil, competente, apreciador do respeito, do amor fraternal e, acima de tudo, o seu profundo sentimento religioso que norteou a sua admirável caminhada neste vale de lágrimas.
Falar de João é falar de um grande militante do amor e da fraternidade, sempre disponível e bem disposto a viver o amor preconizado por São Vicente de Paulo “Amemos a Deus, meus irmãos, amemos a Deus, mas que isto seja a custa dos nossos braços, que isto seja com o suor dos nossos rostos”. Foi um vicentino atuante, despojado de vaidade, muito dedicado à causa dos pobres irmãos que sofrem, comedido nas palavras e honesto no sentir. Sempre disposto a oferecer o ombro amigo aos necessitados, aos carentes do amor fraterno porque ele sabia que em qualquer pedaço de chão, o mundo já não era tão grande. Do misterioso passando a ser descoberto por sua feliz união aos ensinamentos dos vicentinos à luz do Mestre Jesus. Que bom! Pois é, João, quando quisermos uma pessoa amiga como você, exemplo de amor e caridade, iremos procurar, porém dificilmente iremos encontrar. O mundo continuará a ser grande, os pedaços de chão continuarão infinitos e a descoberta anunciada não mais vai ocorrer. O amor continuará a ser esse grande mistério que os poetas buscam a todo momento desvendar. E você, João, com a sua simplicidade e desapego, conseguiu desvendar, acumular e distribuir amor aos necessitados, aos pequeninos justamente porque você se fazia pequenino também. Você sempre buscou a perfeição porque sabia que ela não consiste na multiplicidade das coisas feitas, mas no fato de serem bem feitas. Afeito à oração diária, você não procurava Deus em determinados lugares porque sabia que Deus se encontra em todas as partes, inclusive em sua vida religiosa. Você, meu amado irmão em Cristo, possuía a dimensão da eternidade, não era daqui nem dali, mas de qualquer lugar onde Deus quer que esteja. Até agora, meu bondoso samaritano, você encontrou Deus para sempre.
Agora, meu caro amigo João, a ordem é sorrir para as paredes. Estou disposto a compartilhar o meu sorriso com o seu. Eles se entrelaçam e a isso se dá o nome de amor. Você fez escola em Bezerros, o seu silente exemplo nos edificou a todos nós e, neste momento solene do ocaso, estamos sorrindo com o seu sorriso porque testemunhamos o bom combate que norteou a sua vida. “Dez vezes irão aos pobres, dez vezes encontrarão a Deus” – este é o lema do irmão vicentino que você viveu com muita fé. Desde a minha juventude, quando fui seminarista, admirava a reunião dos vicentinos após a santa missa dominical das nove horas, você participava da reunião naquela sala contígua ao altar mor da matriz de São José dos Bezerros, onde a imagem de São Vicente de Paulo estava entronizada.
João, tentaremos nos consolar e viver com a lembrança eterna de sua passagem, compartilhando uma boa e fraterna amizade que rima com felicidade e realidade. Sendo que a realidade do aqui e agora, é você estar adicionando eternidade com as demais rimas. Apesar de nunca ter-lhe confessado a minha grande admiração por seu belo exemplo cristão – outra rima gloriosa, - conservá-la-ei sempre comigo. Sempre é uma palavra forte, e quando esse sentimento é manifestado, melhor ainda. E é por isso que eu tenho o anelo, o desejo ardente em mostrar aos quatro cantos do mundo o quanto você foi grandioso. Que bom!
Sabe aquele esposo fiel e respeitoso? Aquele pai que tem vários filhos e consegue manter com cada um deles um relacionamento único, pessoal, com suas conversas, conselhos e detalhes como se fossem só deles? Este foi o João que teve por lema o “abençoa, Senhor, a família, amem”. Apesar da respeitosa fé em Deus e na religião, foi com o coração sangrando que João e a zelosa esposa Socorro, assimilaram a passagem do amado filho Eduardo. Assim era o nosso amigo João, que se relacionava de forma única, simples, especial e prazerosa com a sua família e com os seus amigos.
Antecedendo à sua Páscoa, o nosso pobre irmão em Cristo Jesus, recebeu o conforto espiritual de dois bispos, sendo um deles o seu velho amigo, o outro bispo da diocese de Caruaru, levando-lhe a unção dos enfermos. João foi dominado por uma felicidade eternal. Atitude de um santo. Acrescido com o amor espiritual dos dois irmãos frades. Até na hora da morte esta pobre alma praticou a doutrina fundada por Zenão de Cicio (335-264 a.C) – o estoicismo utilizando a ética, valorizando a imperturbabilidade, a extirpação das paixões e a aceitação resignada do destino. Estas foram as marcas fundamentais aplicadas por este santo que agora parte: homem sábio, tornando-se apto a experimentar a verdadeira felicidade à luz da ética cristã. Na véspera do dia dedicado a São Francisco de Assis o nosso irmão fez a sua páscoa. Ótima escolha para entrar no Reino Esplendoroso da Alegria.
Que palavras úteis e de conforto posso dirigir à minha amiga irmã em Cristo, Socorro? Aos filhos, genro, noras e netos neste momento de dor? João deixou uma família bem estruturada no sentimento de urbanidade, cidadania e fé. É nesta Fé que eles assimilarão este momento de grande provação. São sabedores de que se sentirem saudade e quiserem falar com o grande patriarca, falem com Jesus e o nosso amigo os escutará na certeza de que estando com Jesus, ele continuará sendo útil a todos vocês, lá onde estiver. Bem aventurada família que acreditou em seu líder e agora está querendo tê-lo mais perto de Deus! Neste momento, e sempre, podem derramar lágrimas mas João não estará presente para enxugá-las, mas não faz mal, os outros amigos e parentes farão isso em nome do amor. E sentindo-se bem substituído, o nosso saudoso irmão, irá cuidar de sua nova tarefa no céu. Amiga Socorro, não esquecer, quando a saudade apertar, dê uma espiadinha na direção de Deus. Você não verá o seu esposo, mas ele ficará feliz vendo-a olhar para o Eterno Pai. Saiba, minha querida amiga, quando chegar a sua vez de ir para o Pai, aí, sem nenhum véu a separar vocês, irão viver em Deus o grande amor que os preparou para Ele. Que vivamos como quem sabe que vai morrer um dia, e que morramos como quem soube viver direito, à exemplo de João. O amor só faz sentido se traz o céu para mais perto da gente, e se inaugura aqui mesmo o seu começo. Afinal, Deus é Amor.
Com certeza, não iremos estranhar o céu. Sabe porque? Porque todos nós, sendo amigos de João, já somos um pedaço dele! De uma coisa eu tenho certeza: a cidade dos Bezerros acaba de ser contemplada com a entronização de um Santo no rol dos santos de Deus. Que a nossa Virgem Mãe Maria esteja com você, meu amigo!
-” Convém amar os pobres com um afeto especial, vendo neles a pessoa do próprio Cristo, e dando-lhes a importância que Ele mesmo dava”. São Vicente de Paulo.
Descanso eterno, meu nobre amigo.