Meu pai... uma saudade!
Pai... hoje eu senti uma saudade...
Lembrei-me de quando criança... apenas seis aninhos de idade... de todos os seus cuidados... de quando cortei o dedinho da mão... do seu carinho... do seu abraço...
Ahhh... e da nossa primeira viagem em família e, eu, destemida que só, exibindo valentia, corri, sozinha, para enfrentar as ondas do mar lá na Cidade Ocean...
Você estava lá...
Lembrei-me, ainda, do seu embornal de pesca e daquela isca especial que só você sabia fazer... de todas as vezes em que fomos pescar no Sapucaí... da longa travessia de bicicleta pela estrada afora... no acostamento da Anhanguera... do meu pezinho afundado na lama... do aroma do lambari na frigideira...
Você estava lá...
Lembrei-me, também, do pão quentinho que comia antes de ir para a escola todos os dias... e de que quando apresentava o boletim com boas notas, eu ouvia que não fazia mais que a minha obrigação... eu não via, mas sabia que, de costas, sorria...
Você estava lá...
Lembrei-me daquele momento especial que ficávamos juntinhos, pontualmente ao meio dia, na hora do almoço... daquela deliciosa macarronada da mamãe e da coca-cola, sempre aos domingos, porque dizia que era seu dia preferido...
Você estava lá...
Lembrei-me também do jantar, da marmita que eu te levava todos os sábados lá na barbearia Ipanema... da sua cadeira de trabalho que eu fazia questão de sentar enquanto o esperava terminar de comer... da atenção que oferecia aos seus fregueses lá na barbearia... das inúmeras histórias que contava para eles...e para mim... e de quando cortava meus cabelos de tigelinha e... sempre dois dedinhos a mais...
Você estava lá...
Lembrei-me dos passeios na praça da Matriz... da sua permissão para as sessões de cinema aos sábados à noite... da pipoca quentinha servida com sal e molho caseiro do ‘seu’ Alceu lá na esquina do “jardim”... da fileira de engraxates... dos meus irmãos sorridentes engraxando sapatos dos moços...
Você estava lá...
Lembrei-me do quanto se preocupava em não me deixar sozinha e nem mal vista... quando o relógio da praça batia “dez” horas, o senhor passava lá pertinho da fonte luminosa e, antes da música de encerramento tocar... bastava seu olhar... e eu, rapidamente, corria para casa.
Você estava lá...
Lembrei de todas as vezes que me autorizou viajar para São Paulo nas minhas férias escolares... e, de quando terminei o ensino médio e pude ir passar uns dias lá na casa dos meus irmãos e eu toda feliz, fui ficando por lá... e, ficando uns dias... alguns meses... vinte anos...
Você estava aqui... eu estava lá...
Lembrei-me das minhas diversas viagens para o interior... de quando me buscava todo sorridente, de bicicleta, lá na rodoviária... das notícias da cidade contadas ao longo do caminho... dos fatos e das curiosidades descobertas e das interessantes histórias vivenciadas em suas leituras na revista Manchete... momentos que ficaram inculcados em minha memória... que me levaram aos devaneios... à Drummond... à poesia...
Você estava aqui... eu estava aqui... eu voltei para lá...
Lembrei-me do quanto sentia orgulho dos filhos e... que falava de “boca cheia” aos seus amigos e clientes que todos os seus filhos estavam longe... moravam e trabalhavam em São Paulo... mas eram vencedores!
Você estava aqui... nós estávamos lá... e você nos perdoou...
Lembrei-me do quanto você era autêntico... especial em toda sua simplicidade... ensinamento... integridade... e sabedoria...
Da grandeza da alma... do imensurável amor encontrado dentro do peito... do quanto ficou abalado ao perder um de nós... que você tanto amou... e, em vida, você nos amou... e sou grata...
Nós estávamos lá... eu estava lá... você estava aqui... e você nos amou...
Pai...
Hoje você não está aqui!
Pai... senti saudade.
Eu voltei para cá...
E você... para a eternidade!
Pai... você foi presente.
Perdão...
Se fui ausente.
Pai... eu voltei...
Pai...
Chorei.
Pai...
Obrigada!
Aos nobres colegas, que são pais...
E/ou também sentem saudades...
Ensinem seus filhos a valoração da vida
A se apartar de todas maldades
Do respeito às pessoas
Da importância da integridade
Que a presença é eficaz
Já, a ausência, é voraz.
Que o Amor aquece a alma
Traz virtude... paz e acalma!
A vida é... caminhar em teimosia...
Tal qual o poeta...
Viver é... pura poesia!
“Se você procurar bem,
você acaba encontrando
não a explicação (duvidosa) da vida,
mas a poesia (inexplicável) da vida”.
Carlos Drummond de Andrade