João Galo, o soldado urucaraense que foi pra guerra

Conheci o Sr João Ferreira da Silva, que tinha a alcunha de João Galo, irmão da minha tia Margarida, esposa do tio João Paes, o famoso Caraôlho ou Caúca, como queiram; era trabalhador e agricultor, só que não dispensava a danada, uma caninha nos dias de folga, que em quase todos os comércios, era vendido por dose, andava pelas ruas de Urucará, de calça e camisa de manga comprida, chapéu de palha, descalço, mas era assim o costume, filho da nossa Urucará do Sr. José Vicente e de Dona Ana Barbara, ele bem magro branco e ela morena de cabelos longos; que além do Joao Ferreira da Silva, tiveram os seguintes filhos: José Vicente Ferreira da Silva Filho, Damião Ferreira da Silva, Margarida Ferreira da Silva, Tibúrcio Ferreira da Silva e Izabel Ferreira da Silva.

O Sr José Vicente e Dona Ana Barbara, eram avós da Rosi, Meiry, Joaquim, Beto e Nado, meus primos de coração.

Pois é, quando o conheci o nosso amigo e personagem João Galo, ele já gostava de uma pingazinha, moravam ali na parte de baixo da cidade na Rua Principal, chamada de Crispim Lobo de Macedo, um casa de alvenaria de seus pais.

Lembro bem dessa casa, atrás tinha três fornos de torrar farinha, um cajueiro imenso e mais atrás um cafezal que tomava a quadra toda. No pé do cajueiro, depositavam, os caniços, remos, linhas, arcos, flexas, astias (feita de pau darco) de arpuá pirarucu e peixe-boi, pesada, etc.

Lembro de um fato interessante, eu, ainda bem pequeno, vi o cajueiro carregado de frutos, me empolguei e fiquei doido para apanhar um caju, peguei a astia e comecei a picar o caju, a astia bem pesada e lisa, escorregou de minha mão, pegando no meu pé entre os dedos, atravessando-o, até hoje tenho essa marca no pé, tendo o amigo e irmão Roldão, me carregou e me levou em casa.

Eles viviam da agricultura e da pesca, plantavam Café, Juta, Cacau, Mandioca, Castanha, Cana, etc, mas nos dias de folga, o João Galo gostava de tomar uma pingazinha, mas na dele, nunca saiu da linha, respeitava a todos, era brincalhão e amigo. Tinha um ditado, que o pessoal falava pra ele: Olha a faca. No que ele dava um salto, passava logo a mão na cintura, dava uma de esperto, soldado que foi da guerra.

O João Galo, era um cara muito divertido, amigo, não brigava com ninguém, ele passava cedo subindo a rua lá pra parte de cima, quando descia, já vinha tombando, as pessoas tiravam muita brincadeira com ele e eu nunca o vi zangado. Certa vez, o nosso amigo e irmão Eduardo me falou: Zézinho, ele foi pra guerra de 1945.

Daí procurei saber toda a verdade e confirmei, ele como praça, foi convocado sim, embarcou no navio de Manaus para Belém, quando chegou a Belém a guerra acabou, tendo retornado, mas ficou registrado no seu Certificado de reservista, como ex-combatente da guerra. Sinceramente, até eu me orgulharia desse fato extraordinário conquistado pelo nosso amigo João Galo. Não sei informar se o amigo, o Sr João Ferreira da Silva, o nosso amigo João Galo, tudo leva a crer que foi homenageado quando vivo, pois merecia. Se nao me engano, tem uma rua com seu nome, uma justa homenagem a esse homem, que esteve pronto pra ir para uma guerra, lutar e defender a nossa pátria.

Contam uma piada do Sr. José Vicente, o pai do João Galo, que ele já estava pronto para ir pra igreja dia de Domingo, todo na beca, faltou água no pote, pegou o balde e desceu o caminho do Porto pra pegar água, havia passado um barco, veio o banzeiro que acabou molhando seus sapatos e a bainha da calça, no que ele disse: tu quer mesmo é se jogou dentro d'água.

Ele era muito esquentado.

Falar desse personagem foi legal pra mim, eu que o conheci quando menino, a família, seu pai, sua mãe e irmãos. Lembro muito bem, da casa onde moravam, do terreno, com o cajueiro enorme, um cafezal imenso e os fornos de torrar farinha.

Seu João Vicente e Dona Ana Barbara, eram gente muito fina, me tratavam como neto, seus filhos também, tinham a maior carinho e consideração para comigo. Lembro muito bem, fato que jamais esqueci.

Vale a pena esse registro, para que fique na memória, um pouco de nossa historia do passado, para que possa ser lembrado no futuro.

Salve os escritores e poetas

Viva a literatura regional

Que de melhor não se tem igual.

Em 07/12/2020

José Gomes Paes

Poeta e escritor urucaraense

Membro da Abeppa e Alcama