Francisco Victor Chagas — Capítulo, III

Por Nemilson Vieira de Morais (*)

AS NOVAS DESCOBERTAS

O visionário personagem que estou a narrar (o seu Chagas) queria mais: expandiu o seu negócio, com as novas descobertas que se punha a fazer e por outras mais que haviam na região; jazidas de cristais, cassiterita, ouro... Como a do Riacho dos Cavalos, Nova Roma, Passa e Fica, sertão de Arraias...

A COMERCIALIZAÇÃO DO SEUS

PRODUTOS MINERAIS

Lembro-me vagamente, mas Ângela (a filha caçula) confirma que por muitos anos esteve estampado na faxada da Casa Grande, onde moraram, na Rua Vitória com a Rua 7 de Setembro, em letras garrafais (facilmente legível), o letreiro "CASA GARIMPEIRA" um nome de fantasia do seu empreendimento.

Além da extração, comprava e revendia também, os produtos da mineração. Ampliou o seu leque de parceiros comerciais, na aquisição e vendas desses minerais; fez isso como ninguém.

Admiro bastante a sua expertise, no bom sentido, claro; com quase nenhuma escolaridade, num tempo duma comunicação e meios de transportes tão precários...

Onde gastava-se dias para se chegar à Brasília, os Correios prestavam os seus serviços no lombo do burro e, poucos municípios brasileiros contavam com os Telégrafos.

NO BRASIL E EXTERIOR

A sua luta era constante a correr atrás dos melhores preços aos seus produtos de qualidade; não devia dar o seu suor de mão beijada, a preços de bananas.

Pegava a estrada...

Percorria cidades grandes e pequenas, dentro e fora do Estado de Goiás e do Brasil: Cristalina (GO), Teófilo Otoni (MG), Governador Valadares (MG), Belo Horizonte (capital mineira); Rio de Janeiro e até em terras paraguaias.

CONTRIBUIÇÃO

Aqueles garimpeiros de Campos Belos (como os de outras regiões do Brasil), naquele contexto e outros, contribuíram no povoamento e no seu desenvolvimento socioeconômico de alguma forma.

ALGUMAS CARACTERÍSTICAS

DO SEU CHAGAS

Um homem duma estatura mediana, com um físico levemente avantajado, com uma cor parecida ao chocolate, transmitia a aparência duma descendência indígena.

Comedido e de poucas palavras, verdadeiro no trato. Andava pelas ruas da cidade num passo cadenciado, conversava com um, com outro, pacientemente.

“Era alegre, divertido, gostava de contar histórias da vida”.

COMPÔS ALGUMAS CANÇÕES

Nos tempos de bonança os "amigos" vinham a ele e nos períodos das vacas magras, iam-se dele.

Como um poeta, pôs isso na letra duma canção da sua autoria: "Vida de Garimpeiro".

VIDA DE GARIMPEIRO

Outrora fui um homem do dinheiro, mas os meus recursos pouco a pouco se esgotaram...

Os amigos que eu tive em Campos Belos, ao verem-me fracassado, todos me abandonaram.

Onde estão os meus amigos e parentes? Que sempre fogem, sem darem explicações?

Pseudos amigos a dizerem num segundo: o velho Chagas é um vagabundo, não me paga o emprestado.

Certo dia com Jesus eu apeguei-me, e as minhas fraquezas, contei-lhe...

Ele agasalhou-me! Deu-me pão, comida; melhorou a minha vida, a fartura voltou.

Os falsos amigos que haviam fugido da minha presença, estão a voltar, dia a dia, para dar-me os parabéns.

O velho Chagas a dizer num segundo...

Voltem para trás vagabundos!

De mim não terão um vintém.

--Francisco Victor Chagas (seu Chagas).

Obs.: o texto da canção acima sofreu algumas modificações da linguagem com a revisão. Os originais encontra-se nos arquivos da família.

UM VISIONÁRIO

No campo do empreededorismo, o empreendedor José de Sousa Júnior, duma família tradicional da cidade, disse:

"Seu Chagas era um empresário de visão."

Consta nos anais da história que, o seu Chagas contribuiu voluntariamente na construção do templo católico atual (Igreja Matriz, Nossa Senhora da Conceição).

Numa ocasião, duns festejos por lá, uma candidata apresentada por ele (seu Chagas) fora eleita como a Rainha dos Garimpeiros (me fora dito o seu nome, mas não lembro-me).

Construiu as dependências duma clínica médica e deu ao (s) interessado (s) 6 meses sem cobrança de aluguéis. Decorrido o patrocínio, fora alugado. Onde funcionou o "Hospital e Maternidade de Campos Belos". Posteriormente fora vendido ao (s) seu (s) proprietário (s), na década de 1980.

Cooperou também na edificação do Colégio Dom Alano; instituição de ensino de referência na cidade.

Doou ao Erário Público Municipal o terreno para a construção da primeira Cadeia Pública da cidade (dentre outros).

O PASSAMENTO

Aos 74 anos, próximo a chegada dum neto na família, o seu Chagas não pôde vê-lo, pois falecera em (31:10:1985), virou às costas a este mundo, deixou para trás a sua história, um legado e muita saudade (ao descansar dos seus trabalhos na terra).

“Fora um adeus doído deixado nos nossos corações; a dor da saudade. Das lembranças de quando brincávamos com dominós em volta da mesa. Sempre quis o melhor para os filhos”. -- Ângela Chagas

MAIS LEMBRANÇAS DO PAI

“Uma outra coisa: o meu pai gostava muito de cantar. Ajuntava os filhos para tocar; cantava muito bem. Nelson Gonçalves, Cascatinha e Inhana, Altemar Dutra.

A música que mais faz referência a ele é “Naquela Mesa” de Nelson Gonçalves. — É ouvir e emocionar-me.

Outra também chamada de “Sertaneja”, creio que interpretada por Nelson também; são as maiores lembranças que temos do nosso pai.

Gostava de pescar, caçar; as paredes das salas eram adornadas com peles de animais, de apetrechos indígenas… Sempre trazia algo que lembrasse os lugares por aonde andava.

Tínhamos no quintal de casa, animais como Anta, cervo, muitos papagaios; era tantas coisas […] O meu pai deixou um legado de tantas coisas boas!

Ao retornar das longas viagens trazia consigo mimos, para tanta gente… Amava sentar com as crianças de casa e da vizinhança, na calçada da Clínica para contar as histórias, como Aladim e, incrementavam as mesmas duma forma tão (Hilário) que todos, riam muito…” — Ângela Chagas

A FALA DUM NETO:

“Lamentavelmente não conheci o meu avô, mas sei que ele fora uma pessoa do bem; um homem a frente do seu tempo. Mesmo sem uma devida instrução escolar, acadêmica, demonstrou conhecimento da vida e das coisas; bem maior do que o de muita gente esclarecida. Queria muito tê-lo conhecido!”.

— Everton Chagas

O AMOR PELO LUGAR

“Campos Belos, cidade que amou de coração lá firmou moradia; teve alegria e tristezas, sorrisos, lágrimas, mas nunca deixou de amar aquele lugar. Mesmo diante de muitas descepções que sofreu”.

— A. Chagas

PONDERAÇÕES

texto ficou longo, mas o que mais conta é que pudemos trazer à tona, a importância que todos esses fatos tiveram para a história de Campos Belos.

GRATIDÃO

Quanto a nós, sociedade Campos-belense, precisamos compreender o legado histórico e cultural deixado pelos garimpeiros que atuaram (e atuam) nos seus lidares, na nossa região em especial, os dos tempos idos, num reconhecimento diferenciado...

Finalizo aqui o último texto duma série de três, sobre o seu Chagas; onde pude trazer à luz, a importância que todos esses fatos tiveram para a história dessa cidade.

Ao Nonato, a Ângela, ao Everton, à família Chagas, representada pela matriarca D. Otília que, aos 96 anos, ainda poderá ler esta história sem óculos. A tantos outros personagens populares que fizeram (e fazem) parte da história da comunidade campos-belense, fica a minha terna gratidão!

*Nemilson Vieira

Gestor Ambiental/Acadêmico Literário.

(12:01:21)

Texto tecido com informações do Raimundo Nonato Chagas, Ângela e Everton (filhos e neto do Sr. Francisco Victor Chagas).