O POEMA E A POETA: AUTA DE SOUZA
O POEMA...
Caminho do Sertão
(A meu irmão João Cancio)
Tão longe a casa! Nem sequer alcanço
Vê-la através da mata. Nos caminhos
A sombra desce; e, sem achar descanso,
Vamos nós dois, meu pobre irmão, sozinhos!
É noite já. Como em feliz remanso,
Dormem as aves nos pequenos ninhos...
Vamos mais devagar... de manso e manso,
Para não assustar os passarinhos.
Brilham estrelas. Todo o céu parece
Rezar de joelhos a chorosa prece
Que a Noite ensina ao desespero e a dor...
Ao longe, a Lua vem dourando a treva...
Turíbulo imenso para Deus eleva
O incenso agreste da jurema em flor.
...A POETA
Auta Henriqueta de Souza (Macaíba 1876 - Natal 1901) poeta potiguar, pertenceu à segunda geração romântica, com alguma influência simbolista. Em 1900, publicou seu único livro, Horto, com 114 poemas, de grande repercussão e que se esgotou em dois meses. Essa obra foi prefaciada por Olavo Bilac, um dos nossos maiores poetas. Auta teve seus poemas publicados em vários jornais e revistas da época, inclusive no jornal "O Paiz", do Rio de Janeiro. A poesia de Auta circulou nas rodas literárias de todo o Brasil, despertando grande interesse. Venceu a resistência dos círculos literários masculinos e escrevia profissionalmente em uma sociedade em que este ofício era quase que exclusividade dos homens, já que a crítica ignorava as mulheres escritoras. Tornou-se a poeta mais conhecida fora do Estado do Rio Grande do Norte. Segundo o seu conterrâneo Luís da Câmara Cascudo, historiador, antropólogo, advogado e jornalista, é "a maior poeta mística do Brasil". Quatorze dos seus poemas foram musicados por artistas locais dando grande visibilidade ao seu trabalho literário. Embora a vida sofrida, Auta se consagrou como uma das maiores escritoras brasileiras.