TOLERANCIA ZERO E SALVANDO OS PRIMATAS
Hoje o sol está de rachar e o milho que estava em meu bolso virou pipoca. Mas uma vez e como sempre estamos na chácara. Seu Valdemar recebe a visita de um de seus vizinhos, depois de lhe cumprimentar ao entrar no portão lhe convida para sentar. Seu vizinho antes mesmo de se acomodar no tamborete, já vai dizendo:
- Seu Valdemar tá muito quente! Né?
Antes que respondesse, seu Valdemar devolve a pergunta para o vizinho:
- Você acha que está quente?
Seu vizinho responde em seguida:
Demais! Está fazendo muito calor.
Seu Valdemar com aquele jeito gozador lhe diz:
- Graças a Deus que você está sentindo calor, porque se estivesse com frio nessa quentura, eu ia pegar essa Kombi agora e iria lhe levar para fazer lamina na SUCAM, porque com certeza você estaria com malária.
Em se tratando de malária sou testemunha ocular e muitas vezes presenciei meu pai, deitado em uma rede, com vários lençóis sobre ele, na tentativa em vão de aquecer o frio que parecia estar dentro e não fora de seu corpo. E como em um ciclo este frio e a febre iam e voltavam quase sempre na mesma hora.
Nesta época seu Valdemar trabalhava na construção da BR-174 que cortava a floresta amazônica ao norte, e não me recordo quantas malárias pegou, quais os tipos e muito menos a quantidade de cruzes, uma vez que o grau desta enfermidade era identificado por cruz podendo chegar até quatro cruzes. O tratamento era a base de pílulas que era entregue ao enfermo, conforme o tipo e a quantidade cruzes.
Segundo seu Valdemar, em uma de nossas conversas sobre a malária, ele me contou como eram as visitas dos enfermeiros e médicos da SUCAM, superintendência que cuidava da identificação dos casos ou surtos e o tratamento e medicação, ele descreveu assim:
- Chegava no acampamento um ônibus tipo uma enfermaria, que eles chamavam de laboratório, vinham também duas caminhonetas com os enfermeiros e médicos, e equipamentos para fazer borrifarão próximo ao acampamento. Ali eles recebiam a peãozada, para fazer lamina e ver se alguém estava com malária.
Ele me contou também que de tanto pegar malária, e ser tratado com aquelas pílulas, chegou a perguntar para o médico se ele havia sido escolhido para cobaia, nos testes dos remédios. O doutor olhou para ele com um olhar meio sério, e lhe perguntou porque achava isso, e ele foi logo respondendo:
- Doutor, todas as vezes que pego malária, muitas das vezes é o mesmo tipo, mas noto que a pílula que vocês me dão é que é diferente, as vezes redonda, as vezes quadrada, as vezes grande, outras vezes pequena, umas brancas outras meio azulada.
O médico depois de dar aquela gargalhada lhe disse:
- Isso é impressão sua, deve ser a febre que deixa a pessoa meio sem sentido.
Como a maioria das histórias de seu Valdemar não existe mentiras, mas sim, uma turbinada na realidade ele concluiu me contando o seguinte:
- Meu filho, onde a gente trabalhava existia tanta malária que antes daqueles enfermeiros e médicos que passavam dois dias no acampamento, irem embora, tinha um momento que a gente se assombrava com um grande movimento na mata, era uma gritaria, a gente pensava que eram os índios, não demorava e apareciam meio mundo de macacos com cachos de banana para trocar com os enfermeiros por pílula.
Para finalizar ele me disse também que:
- Havia até um teste para saber se a pessoa estava curada da doença ou a doença estava encubada, diziam que era tiro e queda, bastava um copo bem gelado do suco doce da cana-de-açúcar, conhecido como caldo de cana.