ATRIZ ANTÔNIA MARZULLO 6

SUPERANDO OS OBSTÁCULOS

Mas Antônia não era de fugir à mais esta luta e, com denodado esforço, surpreenderia a todos, prosseguindo em “A Moreninha”, como veremos na crítica de Van Jafa, publicada na p. 2, do 2º Caderno de jornal Correio da Manhã, em 10 de julho de 1969:

“TEATRO

A Moreninha

O TEXTO. O romance A Moreninha, de Joaquim Manuel de Macedo, permanece válido e dotado de seu feiticeiro interesse. Já havia merecido uma versão dramática, montada nos nossos palcos. Com Bibi Ferreira protagonizando a heroína de Paquetá, adaptada por Mirael Silveira. Infelizmente, a presente versão é a mesmíssima versão obsoleta que Mirael Silveira permitiu que fosse musicada, menosprezando o gênero de comédia-musical e de suas possibilidades extraordinárias.

O que há de ‘novo’, ou de contribuição nesta ‘adaptação’ para comédia-musical, é, praticamente, a contribuição dos atores, ou seja, aquilo que é condenável, comumente chamado ‘caco’, acréscimo quase sempre humorístico, quando não piadístico, que foi permitido e absorvido pelo espetáculo.

A comédia-musical é o gênero desta metade de século, por excelência. No mundo inteiro há uma intensa produção de comédias-musicais, com uma aceitação extraordinária por parte do público. O que é lamentável é que todas as vezes que se apresenta uma oportunidade para a comédia-musical brasileira aparecer e se afirmar, a oportunidade é pouco levada a sério, quando não desvirtuada.

A adaptação de Mirael Silveira é inteiramente destituída de interesse dramático e não atina com o propósito e o espírito da comédia-musical.

A MÚSICA. A partitura de Cláudio Petraglia é irregular, se bem que possua bons instantes e, de certo modo, seja prejudicada por não estar devidamente trabalhada no sentido das orquestrações, vocalizações etc., e de não haver uma orquestra ao vivo e sim uma trilha sonora, com a melodia para os intérpretes cantarem.

A COREOGRAFIA. A coreografia de Jura Otero é discreta, sem maiores voos criativos, com alguns aspectos agradáveis, independente de não conter os arroubos coreográficos ou inspirações dançadas, que uma comédia-musical exige.

A CENOGRAFIA. Cenograficamente, ‘A Moreninha’ tem dois instantes positivos, na sala da casa e na gruta, em Paquetá, muito bem criada pela visão cenográfica de Flávio Phebo, que também defende os figurinos, dentro de uma escola cromática bem vivida.

OS INTÉRPRETES. Marília Pêra protagoniza com sua vivacidade e seu talento, devendo preocupar-se um pouco mais com sua voz, que merece estudo. Perry Salles não interioriza seu personagem, fazendo-o apenas por fora. Adolfo Machado compõe com muita graça seu Kléber. Antônia Marzullo faz, com muita propriedade, a Donana. Fernando Almeida está à vontade no seu Leopoldo. Dinorah Marzullo tira partido de sua D. Violante. César Roldão Vieira, Ricardo Petraglia (progredindo), Carlos Alberto e Genésio Amadeu, todos cumprindo seus personagens. Tony Penteado (revelando-se), Bruna Fernandes, Zezé Motta e Cláudia Mello também valorizando suas personagens.

O ESPETÁCULO. O diretor Osmar Rodrigues Cruz não pensou, nem pesou seu espetáculo, em termos de comédia-musical. Estruturou seu espetáculo sem a alegria e o romantismo necessários ao gênero. Sua direção carece de ritmo e de atmosfera magnética das comédias-musicais.

Aos defeitos de adaptação, a ausência de uma orquestra viva e a necessidade de maior número de comparsas, o diretor Rodrigues Cruz não procurou suprir com um brilho e uma vivacidade, que só o tempo exato de representação pode proporcionar.

Sua direção é quase diferente, o diretor se deixa conduzir e não conduz o espetáculo, transmitindo ao espectador uma sensação de um espetáculo demasiadamente longo, deixando visível os vazios, as falhas, a adaptação defeituosa.

Lamentamos que ‘A Moreninha’ ficasse aquém da nossa expectativa. É, sem dúvida, um experimento impregnado de certa curiosidade, que independe de agradar, deixa o espectador insatisfeito, como que frustrado. A comédia-musical que resultou da adaptação de ‘A Moreninha’, mesmo destituída do seu feitiço, merece ser vista, como uma tentativa no sentido da comédia-musical, gênero tão importante quanto vital”.

Fragmento do livro “Antônia Marzullo, uma atriz que falava com os olhos”, de Nelson Marzullo Tangerini.

Nelson Marzullo Tangerini
Enviado por Nelson Marzullo Tangerini em 30/06/2020
Reeditado em 30/06/2020
Código do texto: T6992195
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