Homenagem à uma professora

Homenagem

À professora do 2° ano de 1987 em Pindoram-Bahia

Prezada, não sei mais o seu nome, afinal, foram só duas semanas de aula.

Naquele ano, eu com 14, quase 15, fui matriculado pela primeira vez numa escola pública eu mais 6 irmãos. Era o segundo ano do primeiro grau.

Havia em mim uma preocupação. Nunca ser chamado a atenção em sala. Lembro ainda que a minha professora saía de sua mesa e nos auxiliava onde estávamos. Era dinâmica, bonita e jovem. Parecia não ser casada.

Um dia a senhora me disse que queria falar comigo no intervalo. Fiquei preocupado e pensando no que teria feito, pois certamente seria chamado à atenção. O intervalo chegou e todos saíram. Fiquei para ouvir a senhora e a senhora me perguntou se já havia estudado o segundo ano e disse que sim, mas não todo. Porém a senhora me disse que não estava satisfeita comigo porque todas as atividades que passava eu respondia e terminava primeiro que todos e nada lhe perguntava e quando você conferia minhas respostas estavam exatas. Então me disse: de segunda-feira em diante você vai estudar na terceira série. Não lhe falei antes pros meninos não se sentirem ofendidos.

Fiquei feliz. Hoje percebo o quanto a senhora foi ética, naquele ano pra mais de 30.

Mantive em segredo e ao chegarmos em casa naquela manhã, avisei ao meu pai que ia estudar no 3° ano.

Meu pai nos comunicou que daquele dia em diante íamos trabalhar o dia todo para arrumarmos recursos pra voltarmos pro Ceará.

A vontade de estudar era grande, mas a vontade de voltar pra minha terra era enorme. Aí não fomos mais pra escola.

Dias depois encontrei a senhora na feira de Pindorama, num domingo, e a senhora me abordou: porque não vieram mais estudar? Expliquei a razão e a senhora continuou. Pelo menos você precisa estudar. Volte a estudar. Não pare de estudar!

Saí da nossa audiência cheio de vida e de entusiasmo. Foi a primeira pessoa, depois de mamãe que já era morta, que se preocupou comigo e que conheceu minha capacidade.

Por ironia ou sorte, não sei, encontrei uma cédula de 50 mim cruzeiros rolando na rua sem calçamento de Pindorama. A cédula tinha um carimbo: 50 Cruzados Novos. Coisa de José Sarney, presidente na época. Foi uma alegria exorbitante. Entrei na primeira mercearia e comprei o meu primeiro caderno de matérias, um lápis, uma borracha, uma caneta.

Cheguei em casa muito feliz, radiante e entusiasmado. Porém meu pai não deixou. Chorei. Sim. Chorei.

Mas, finalmente chegou o dia de voltarmos e entramos no ônibus que fazia a linha Pindorama/Guanabi. Ao entrar lhe avistei numa cadeira e me perguntou pra onde iríamos e lhe falei. Então me recomendou com uma preocupação de mãe: Ao chegar lá vá pra escola.

Querida professora, a vida foi muito cruel comigo e não me permitiu estudar. Mas nunca esqueci a senhora nem suas palavras encorajadoras. Eu tinha muita vontade de estudar e nunca perdi a vontade e nunca lhe esqueci até hoje.

Quando me casei aos 26 anos, tinha apenas a quinta série. Resumindo, para não lhe cansar, hoje sou casado há 21 anos, tenho dois filhos que concluíram o Ensino Médio e tenho um netinho de 2 anos.

Sou professor efetivo na cidade de Itapipoca e coordeno, pedagogicamente, "minha escola". Hoje, ia eu pra uma formação pedagógica e lembrava minha trajetória escolar e não podia esquecer você, seus conselhos e preocupações. Mesmo dirigindo minha moto chorei ao lembrar de você e de suas motivações.

Quero lhe dizer que não desisti e que suas palavras são-me úteis até hoje e continuam me impulsionando com a mesma força de 32 anos atrás. Obrigado, minha querida professora.

Tenho muita vontade de lhe ver de novo. De lhe abraçar e de sentir-me menino outra vez diante daquela que me ensinou a maior de todas as lições. Nunca desistir.

De seu eterno aluno Carlos Jaime. 27/02/2019

As palavras que um professor diz a um aluno podem determinar o sucesso ou o fracasso desse aluno.

CARLOS JAIME
Enviado por CARLOS JAIME em 27/02/2019
Reeditado em 17/12/2019
Código do texto: T6585121
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