E com vocês, o Professor Paulo Miranda
Quinze de outubro de 1969. Dia do Professor. Noite, aliás. Eu me achava assentado no pátio interno daquela escola no bairro Concórdia, em Beagá, junto a uma chusma de colegas de magistério, com a alunada à nossa frente.
Se não me falha a memória, era a minha primeira experiência de dar aulas em classe, iniciada ali no meio daquele segundo semestre. Herdara a posição de um colega das Letras, o Marcus, que não me explicara a razão de sua saída. Possivelmente, por coisa melhor - estimei, sem contudo vocalizar.
Inglês era a disciplina, muito embora eu perseguisse à época um diploma de alemão - pois era o que me sobrara, em função da classificação "apenas raspando" no vestibu(r)lar. Aber ich hatte Höffnung...de dias melhores. Ou noite, como ainda era o caso.
E com duas semanas de prática, estava eu ali, aos 19 anos, mestre de uns trinta e tantos alunos, ombreando-me com o corpo docente já senhorial, onde já luzia e resplandecia a simpática figura do Professor Ronaldo, estudante de medicina, em seu imponente guarda-pó. Um ou outro eu conhecia de nome ou de um meneio de cabeça ...é já no meio daquela efeméride...que se colocava tão bem entre a pisada de Armstrong no solo lunar, e a noite estelar dos mil gols de Pelé...
O Professor Ângelo, um cinquentão delgado de corpo e de pelos, era nosso Diretor. Fez a saudação e nela, breve, porém inflamada, alusão à luta junto às autoridades constituídas - à época, anos de chumbo, eram mais instituídas - e junto à comunidade para a criação e manutenção da escola, a menina de seus olhos. E nesse contexto, tomado pela emoção, evocou a figura de um parceiro na empreitada que convocava para nos narrar com mais detença a história dessas lutas e, alteando a voz, chamou ou clamou pela presença do Professor Paulo Miranda...
Absorto que eu andava, imaginando que a platéia generosamente compartilhasse comigo sua mirada para o Professor Ronaldo e outros luminares presentes, ao ouvir a chamada do Diretor Ângelo, simplesmente gelei: com duas semanas de frequência ali, mal conhecendo as tortuosas ruas que levavam à escola, logo eu para narrar sua história...? O delírio contudo foi brevíssimo...com pouco passou rente a mim, quase relando o paletó de seu terno preto em meu ombro esquerdo, a figura inesquecível que me salvaria daquele súbito pesadelo: o Professor Paulo Miranda. Sua figura fez-me lembrar a de um lutador de truz, campeão do mundo aliás, se não presente ali, de um futuro não distante, além da credencial de desafiador e vencedor de Muhammad Ali: Joe Frazier. Bem escanhoado, e enfarpelado.
E não só salvando-me do sufoco, Paulo, Professor de História, empolgou-nos todos com uma bela e vitoriosa narrativa, a que ouvi já mais descontraído, achando até que a bela irmã mais velha da aluna Sureya Said Hamzi ali se encontrava movida mais pela curiosidade do que pela solenidade...