Aos paulistas que me suportam
São Paulo das recordações que não tenho, mas que abriga em seu coração algumas das grandes amizades que orbitam ou orbitaram em mim: Audálio Dantas, Ignácio de Loyola Brandão, Kathleen Lessa e alguns amigos de infância que migraram no pau-de-arara para o eldorado brasileiro. Tenho mais parentes em São Paulo do que na Bahia.
Uma vez estava no sossego da minha rede e o telefone tocou. Era uma moça da Biblioteca Monteiro Lobato, de São Paulo, querendo saber quem eu indicaria para uma palestra no aniversário da cidade. Indiquei Ignácio de Loyola e o meu irmão que, à época, era cronista do Jornal do Brasil. Ainda dei o tema: A cidade e a roça, em homenagem, também a um dos maiores cronistas brasileiros: Rubem Braga.
Doutra feita, outra moça da Secretaria Estadual de Educação me pediu autorização para publicar no livro didático 2011/2014 um poema sobre o pau-de-arara que tinham visto no meu blog. Também várias professoras me escreveram dizendo que estavam trabalhando a cultura popular nordestina com um vídeo de uma banda de pífano que também estava no blog.
Uns quatro anos atrás uma revista me pediu um texto sobre a cidade da garoa em homenagem aos seus 460 anos. Escrevi, gostaram, e publicaram. O mais interessante disso tudo é que eu não conheço a cidade. Nunca pisei meus pés no solo dos bandeirantes, mas a minha alma flutua sob seu céu cinzento.
Assim, antes de cair nos braços de Morfeu, faço uma singela homenagem aos meus amigos paulistas do Recanto, contando três histórias da imigração nordestina.
Tirou o dia para conhecer São Paulo. Seis meses na cidade e só conhecia os botequins do bairro onde morava. Pegou um ônibus e deixou se conduzir sem destino. Curtia a cidade pela janela lateral até ser interrompido pelo cidadão sentado ao seu lado:
- Você é daqui mesmo?
- Não. Sou baiano.
- Que coincidência! Eu também sou baiano.
- É? de onde?
- Sou de Caruaru, em Pernambuco.
- ?!
......
Um dos meus tios tinha um vaqueiro analfabeto. Não fazia um ó com o fundo de uma garrafa. Um dia esse cidadão resolveu largar tudo e se aventurar em São Paulo. Colocou a mulher na mala, pegou um pau-de-arara e bença e tchau.
Ao contrário de mim que não consigo retornar, um dia ele retornou ao sertão. A coisa estava preta. Escreveu ao meu tio pedindo guarida e mandou por um portador que estava a caminho de Salvador. Dois dias depois o portador retornou.
- Iaí, entregou o bilhete a Alvino?
- Entreguei, mas ele disse que não entendeu nada do que estava escrito. Falou que só havia uns rabiscos.
- Bem que eu sabia que ele não ia entender a letra de Sumpalo!
....
A minha prima foi visitar uns parentes em Sumpalo e retornou depois de um mês. A parentada toda à espera para saber as novidades. Ela se sentia o centro das atenções. Foi no quintal e retornou correndo, assustada:
- Mãe, que bicho é aquele lá no quintal?
- Nossa, filha, é uma galinha!
- Vixe, mainha, esse bicho morde ou bica?