Dona Helena

Há coisa de uma semana, Pitangui, a tricentenária Velha Serrana, perdeu uma de suas preciosas jóias: Dona Helena Morais Valério, cuja existência estendeu-se por quase nove décadas. De ascendência imediata de imigrantes libaneses, assim como seu marido, um Valério - já falecido, e por sua vez, representando a parte italiana na composição do casal - essa conjugação de sangue mediterrâneo brindou a cidade com uma penca de filhos que enaltecem a nossa sociedade, em variados campos da atuação profissional.

Se os Valérios têm uma ligação já de quatro ou cinco gerações com a cidade e a região, os Morais não ficam muito distantes. Um registro colhido na valiosa História de Pitangui, de autoria do Monsenhor Vicente Soares, dá-nos conta de que o primeiro casamento que aquele saudoso padre celebrou em Pitangui foi entre os pais de Helena, em 1911. Subsequentemente, conforme se pode notar no frontispício da casa verde do Calixto "turco", vê-se gravado o ano de 1916, que corrobora a longevidade dos laços do clã Morais com a nossa terra. Acho que até o jasmineiro que orna o jardim do referido casarão, na suavidade permanente de sua fragrância, muito teria a nos dizer se viesse a escrever um romance da vida da cidade em torno de sua imponente matriz de Nossa Senhora do Pilar.

E se do outro lado da imponente matriz da cidade concentra-se o clã Valério, não custaria muito ao atento leitor imaginar que Helena e João

só tinham uma igreja a separá-los fisicamente, e a os unir maritalmente por longas décadas.

Minha lembrança de Dona Helena, a quem vi poucas vezes, encerra um único encontro, e uma dura, mas necessária lição: quando aluno da quarta série primária, voltando da aula matinal na companhia do quase inseparável Edinho Campos, meu vizinho, nos cruzamos com dois meninos de dona Helena, justamente no jardim central da cidade, uniformizados, e a caminho da escola.

Uma altercação verbal, decorrente de caçoada do Edinho, e sem reação dos petizes, lançou-nos à perseguição desenfreada. Sem medir consequências, joguei minha pasta de couro nas costas do maiorzinho que caiu, incontinenti, e se arranhou no piso que era ainda de chão batido.

O que se seguiu foi uma visita de uma mãe justamente indignada à casa de meus pais, onde recebi, na vista deles, a descompostura de minha vida. E não havia como contra argumentar, o ataque havia sido injusto, covarde e desproposital.

Sei que é tardia agora essa minha manifestação, mas a verdade é que aprendi a respeitar e admirar Dona Helena e a família tão honrada que ela tão bem soube criar.

Paulo Miranda
Enviado por Paulo Miranda em 15/01/2019
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