A VELHA SENHORA DA VARANDA

I

Bem próximo da praia de nome Tabuba, existe um sagrado chão.

No meio de casas, de amenos verdores, de árvores cercada,

coberta de flores, desvelando o modo com que foi assaz cofiada.

Recanto de primores, alteiam-se lá os tetos d’altiva mansão.

II

Na frente da casa se estende uma varanda,

onde senta - se a dama; da família senhora e, da prole servil.

Quem é? - todos sabem: seu nome garboso é Rocilda.

Nascida na “passagem das pedras”, Itaiçaba, acanhada.

Mas, descendente, isso é certo - duma família gentil.

III

Ressalta - se - lhe do pai, em seu rosto, a linha aquilina.

Entre quatro rebentos, introjetou dele o forte e marcante perfil.

Os olhos azuis, claríssimos, difundem as luzes que ali se vão,

tal um corpo celeste que do sol resplandece o clarão.

IV

Infância feliz de inocentes folguedos, ambiente airoso.

Jovem, tomaste a si os inúmeros afazeres do lar,

pois quis o destino, tão cedo, trazer-te um esposo

e ambos geraram filhos, quatro, de modo exemplar.

V

Agora; bisnetos, netos, filhos, parentes, muitos são.

Entes queridos de ânimos fortes e inúmeros amigos,

que para lá se acercam para visitas, encontros,

festas... bons momentos. Serena diversão.

VI

Lá, na mansão onde vive, nas festas, que ama,

os velhos sentados recordam estórias de outrora,

e os moços inquietos, que a festa enamora,

derramam-se em torno dessa alegre dama.

VII

Desde cedo previa: sua prole conseguiria a vitória

e, com respeito, atenderam à voz da matriarca - mor.

São distinguidos os frutos da velha ascendente e, seu nome lá,

voa na boca das gentes, condão de prodígios, de glória e amor.

VIII

Relicário de verdades, sem meia verdades ditas

nos assuntos que não fosse sobre os seus:

Aí não, esses sempre eram belos, com liso peritoneus...

Achava-os mesmo “Adonises” e “Afroditas”.

IX

Suas brincadeiras provocativas com o genro,

demonstrava o seu imenso amor maternal.

Suas histórias risíveis com roteiro programado

pregavam-lhe “peças”. Querer bem, nada de mau.

X

Qualquer viagem lhe agrada, desde que demorada,

exultante ficava se algo pudesse atrasar a chegada.

Vibrava os passeios, desde que com adrenalina

acompanhava os netos que a levavam, como menina.

XI

As três amigas/primas matriarcas, enquanto vivas,

protagonizavam inúmeras e deliciosas estórias.

Queria ser a última citada nas brincadeiras e paródias,

transparecendo vontade de viver por muito tempo mais,

e assim, o passar do tempo se fez...ela foi a “de detrás”.

XII

O tempo é cruel, não para, avança somente,

só sabe passar;

XIII

A velha senhora, lúcida, perfeita mente,

viu sua hora chegar;

XIV

Apegou-se ao último pulsar, no epílogo,

e já não lhe restava nenhum;

XV

Enfim, partiu para essa última viagem de fogo,

sem frio ou calor algum;

XVI

Suas cinzas no mar se espargiram,

ao pôr do sol no espigão;

XVII

Agora segue viagem ao infinito, pelo mar,

tentando se demorar.

XVIII

E, no paraíso praiano, na casa,

na varanda de lá,

existe uma cadeira vazia

e a velha senhora lá não está.

*Este texto -poema é uma rapsódia inspirada na obra imortal de Gonçalves Dias: I - Juca - Pirama (1851).

thiticobomfim
Enviado por thiticobomfim em 16/01/2018
Reeditado em 06/02/2018
Código do texto: T6228023
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