Meu amigo José

 
 
Tenho um amigo que não tem jamais qualquer certeza absoluta de que Deus existe. Todos os anos ele prepara o mesmo pequeno e delicado presépio, uma arvorezinha com enfeites preservados desde os tempos ancestrais quando sua mãe, muito católica, ignorando os Princípios do marido convictamente ateu, comemorava o Natal com todo seu coração. Meu amigo, pelo amor profundo à própria mãe,mas também porque ele mesmo é um grande místico que se ignora ou faz que se ignora como tal, todo ano espera pela Missa do Galo. Fica sempre muito melancólico, sempre com muita saudade, mas, se deixa acalentar pelas lembranças: os irmãos pequenos em volta da árvore, os presentes singelos, os cânticos, a ceia sempre modesta e sempre tão terna, tão aconchegante. E o Menino presidindo tudo. Meu amigo, há muito muito triste, fica melancolicamente feliz em cada Natal. Meu amigo, de nome José... Meu amigo José.       



Você quando tão jovem... Jovem como eu, o mundo, o tempo, os sonhos...




 
     A homenagem a Jorge Lescano, aquele que foi meu companheiro



        Ontem à noite, galeria Metrópole, a famosa, a histórica, centrão de São Paulo, espaço cultural para eventos alternativos Tapera Taperá
        Fomos de Uber, minha amiga Vavá (Valéria Steiner) e eu. Vavá foi até o hall e solicitou a cadeira de rodas. Trouxeram-na, puseram-na nela e 'viajei' até o 2º andar onde, na extremidade do corredor, fica o Tapera Taperá. Jamais conseguiria percorrer toda aquela distâncioa só com minha bengalinha.
        E lá meu querido amigo Maurício, organizador do evento, parceiro em 'priscas eras' de apresentações musicais no SESC e em outros espaços. Naquele tempo um jovem tenro, agora um senhor, pai de filho adolescente; Jorge B. bailarino, professor de expressão corporal, companheiro de trabalho por muitos anos nas peças montadas por ele e Jorge Lescano; Carminda, também diretora de teatro, amiga e parceira de Jorge, ex-alunos e outros colegas de trabalho nas múltiplas áreas de atuação daquele que foi meu companheiro de vida e amigo sempre...
        Conheci seu neto mais novo, Iuri, e essa foi uma grande emoção. O outro neto, Jimmy, não pode estar presente em razão de uma prova na USP, ele, estudante de Física.   
        Foi maravilhosa a homenagem... maravilhosa. Revi tantas mais pessoas queridas que não via há... séculos... Falamos todos de Jorge, do que ele representou para a vida e para a história de cada um. Um painel com cenas das peças que ele dirigiu... Leitura de textos seus... Depoimentos sobre sua função como leitor, escritor, professor, diretor de teatro, artista plástico (...) Comoção funda em todos nós...mas, ninguém chorou.
        Fui e voltei sã e salva, embora com muitas dores físicas, mas isso é a norma  ainda que quando consiga arredar o corpo daqui fiquem bem piores.Assim que editá-las, coloco algumas fotos. Poucas pessoas, pessoas especiais, homenagem especial. Uma das minhas únicas alegrias efetivas neste ano, talvez a maior delas. Bom dia, amigos.Beijos.

        P.S. Minha irmãzinha Vavá: sem ti eu não teria podido  ir a esse evento, fundamental para mim, evento no qual  fui peça importante, é preciso que eu o admita. Muito, muito obrigada.





Algumas poucas fotos que tirei no encontro em homenagem ao Jorge























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A um amigo em Portugal / Volta para casa




Amigo

queria estar contigo aí
muito longe de todos os mundos
e de todos os tempos daqui

daqui onde não me sinto
onde não sou nem importo
a quase vivente nenhum
onde não me sabem
nem poderiam

daqui onde a dor me cerca
por todos os lados
onde a dor me toma
desde a medula da alma

daqui onde eu estrangeira
aqui e em toda parte
como nos diz sempre de si
aquele outro
aquele bem-amado

aquele que de e em Portugal
sabia todas as Línguas dos exílios...

Amigo
ainda que me leves contigo
para passear contigo
em todos os cantos daí
não serei senão essa sombra
que há tanto carregas...
a sombra com meu nome.

Não serei eu...
Aqui fico
sombra da sombra da sombra...
aqui, ao avesso e do avesso de mim
eu que ninguém sabe
nem os que me amam
ou julgam que.
- Imagine os que não!

Como poderiam saber-me
se eu há muito ou desde sempre
também não me sei?

Farei ainda mais de faz-de-conta
esses dias
esse tempo
de agonia e de inutilidade
esses dias
em que me sinto morrer...
Farei de conta
que caminhamos de verdade
por essas ruas...
sentada contigo a esses cafés

à sombra de Miguel Torga
de Mário de Sá-Carneiro
e de outros bem-amados...

principalmente à sombra e muito longe de mim...
principalmente...




Escrita meio... espasmódica, tecida neste agorinha e imediato tempo de escrita, sem reflexão, sem pausa, para não ter tempo de me arrepender... Um poema? Sei lá... Qualquer coisa. Chamarei de poema... mero acaso de nomenclatura.


Nota. Reli e fiz apenas uma correçãozinha. Eu havia escrito: Aquele que de Portugal"... Agora ficou: " Aquele que de e em Portugal" - só isso.

16 de outubro de 2017

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Volta para casa - (pós-escrita) -  25 de novembro de 2017



E neste ano aziago
me fazes saber
que enquanto eu sonhava
ruas e cafés contigo
na companhia
de poetas do nosso amor
já na chegada à terra
dos teus pais
de teus antepassados
uma morte te aguardava
e tu, desarvorado,
quebrada a espinha dorsal
de teus planos
os deixaste abortados, todos.

Amigo meu, e mais não me cabe
narrar aqui
dos horrores que lá
te perseguiram
e na volta aqui, os mais outros que te aguardavam...

Que tempos esses
para ti, para mim, para os nossos...
Que tempos esses...

Que cessem...
Que cessem...
Urge tempo de algum descanso...
Urge! Urge!
Que algum Deus nos ouça!




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