Doga joga?
Doga era a Olga Pereira, também Maria, filha de Romualdo e de Dona Bia. Pra meninada toda da vizinhança era simplesmente a Doga. Com a irmandade toda, de que vinha no meio, devia chegar à dezena.
Inda há poucos dias correu a notícia de sua partida, antes ainda de entrar na casa dos setenta. Foi para a casa do Pai, que a eternidade ostenta. Embora estivesse o largo da Cruz separar as ruas em que vivíamos, Ignácio Camilo, a dela, e meu o Beco-sem-Saída, muita coisa sadia nos unia.
A começar pelas peladas na ruas empoeiradas em que Olga se destacava, e até melhor do que o seu mano Dinho jogava. E com que habilidade a bola de meia, no meio do peito, matava. E como aquele objeto abjeto, que nem esférico era, inveja a tantos nada santos nos dava...
E os anos de cinema da fábrica, da expectativa do escurinho, e de ginásio vieram, concomitantes, mas, no ensino, em turmas separadas, até mesmo de turno, e todavia continuamos caminhando lado a lado. E se não dançamos em nossa formatura de 1965 foi por pura vergonha que tive de lá ir. Além de me achar ridículo naquele terninho preto, quiçá antecipasse inconsciente e amargamente nossa separação.
Que foi longa, bem longa. Das visitas ocasionais que eu fazia à casa de Dona Bia para jogar um buraco ou ouvir o Dinho tocar violão, raro era Olga estar presente, ou desocupada, tanto que ajudava nas domesticidades inadiáveis e intransferíveis.
Na derradeira década se a vi um par de vezes, será a conta certa, e insuficiente para tanta troca necessária de recordações e vivências. Mas ela nunca deixou de ser a dona da bola.