Pai Herói (homenagem ao dia dos pais)

Muitos filhos se identificarão comigo, porém, raros pais se identificarão com este verdadeiro...

Pai herói

Pai...

Hoje, vendo um comercial de refrigerante na Internet, lembrei-me de sua participação como pai e como ser humano em tantas ocasiões:

Nas inúmeras festas, verdadeiros banquetes que fazia, não só proporcionava momentos inesquecíveis aos convidados mas também oferecia comes e bebes aos mais pobres. Lembro-me das filas que se formavam em nosso portão ao final de cada festa. Alguns vindos de muito longe, trazidos por parentes e amigos que já sabiam da farta distribuição em nossas festas. E que linda imagem eu guardei de você dançando tango e bolero, sempre vestido impecavelmente como um astro do cinema. Era a melhor cena da festa...

Durante toda a minha infância e adolescência, você me acordou em todas as manhãs levando café na cama e um presente a cada dia, nem que fosse apenas uma caixa de bombons e ensinou-me a festejar cada dia como se fosse um dia especial e nossa brincadeira de “cabeleleira” quando, quase todos os dias, eu pedia para te pentear e maquiar e fizemos tantas vezes esta brincadeira até o dia em que você foi até a sala para atender aos seus amigos coronéis e esqueceu-se de tirar a maquiagem, os bobbies e os brincos que te coloquei e ainda esbravejou com eles:

- O que foi? Afinal de contas, vocês não brincam com seus filhos? É só uma brincadeira, ora!

E, quando eu fiz 10 anos e você foi me acompanhar na compra de meu primeiro sutiã, tranqüilizando minha mãe, dizendo que não havia segredo, bastaria entrar na loja e fazer o pedido e depois levou uma meia hora para explicar à vendedora o que eu precisava... O orgulho com que comprava presentes iguais para minha mãe e eu e nos apresentava a todos como suas “duas namoradas” e, quando meu irmão nasceu e você passou a comprar carrinhos e bonecas iguais para nós, “para não nos sentirmos em competição” seus amigos conservadores, horrorizados, comentaram que seríamos homossexuais e você, irritado, respondeu:

- Não importa quem ou o quê meus filhos sejam, sempre serão meus filhos! E homossexualismo não tem nada a ver com carrinhos ou bonecas, seus ignorantes!

Mas você não foi somente um grande pai, você foi um grande herói, salvou muitas vidas, inclusive a minha.

Quando o avião em que viajávamos fez um pouso forçado, você não pensou em você mesmo, começou a resgatar as vitimas uma a uma em meio ao combustível que se espalhava rapidamente e só saiu ao resgatar a última pessoa... Eu era somente um bebê, porém cresci ouvindo minha mãe exibir as cicatrizes de queimadura nas pernas, dizendo que esteve ao seu lado (e comigo no colo) durante todo o resgate até mesmo quando o avião explodiu logo após vocês se distanciarem... Era a forma dela dizer que também era uma heroína...

Depois de alguns anos salvando muitas pessoas em inúmeras ocorrências, novamente sofremos um acidente aéreo, desta vez caímos no mar. Eu tinha cinco anos mas guardei bem a sua imagem nadando por um tempo interminável me carregando nas costas. E não esqueço que, ao chegarmos em terra firme, a primeira pergunta que te fiz foi:

“- Pai, se tudo era água e, depois ondas, como você sabia para que lado ficava a praia?” E você, ofegante e meio transtornado, só conseguia repetir

- Meu Deus, o piloto ficou”...

Segui a vida sofrendo acidentes, alguns provocados pelo meu descuido e ingenuidade outros pela “sina de um destino machucado” e, quando entrei em coma por nove dias, só você ficou sentado dia e noite ao lado da minha cama, meditando e me aplicando aquele Reiki que você sabia fazer e funcionava com todo mundo, só comigo e com meu irmão parecia não funcionar. E, ironicamente, foi no nono dia, quando você, exausto, desistiu e foi dormir que eu acordei achando que tinha estado sozinha o tempo todo. Custei a acreditar quando me contaram que você esteve comigo pelos nove dias sem sequer cochilar...

Como acontece com a maioria dos casamentos, um dia o amor acabou entre você e minha mãe, as discussões que, antes eram tempero deste amor, passaram a ser o único elo. Em algum momento, nós, os filhos, entramos neste clima de discórdia. Passei a ver muito mais seus defeitos que suas qualidades. O que, antes me parecia proteção, passou a ser arrogância e prisão, o que me parecia liberalidade sua, passou a ser descaso. E você já não parecia mais tão amoroso quanto antes. E foi assim, de discórdia em discórdia que acabamos cada um morando numa casa, cada um carregando seus traumas, mágoas e lembranças próprias. E, mesmo morando em casas separadas, mesmo estando em fase terminal de câncer, você ainda me ensinou aqueles passos de tango que eu não esquecerei nunca.

Hoje, relembrando todos os seus atos de bravura, seu altruísmo e cuidados com os mais necessitados e toda a sua dedicação como pai e marido, sei que é impossível citar todas as lindas cenas que nos proporcionou em família, todos os salvamentos que fez, quantas vidas devolveu às pessoas, muitas que você sequer conhecia e quanto doou em todos os sentidos a todos os que precisaram de você. E, na minha trajetória, nunca conheci um homem como você. Ou eu não procurei bem ou, talvez, homens como você não passem duas vezes pela vida da mesma pessoa. E admito que, por mais erros que tenha cometido, seus acertos foram imensamente maiores e mais importantes.

Em breve, as pessoas comemorarão novamente o dia dos pais e minha homenagem a você será este texto, simples, sem grandes argumentos porém com carinho e reconhecimento pelo grande homem que você foi.

E termino dizendo que, de todos os ensinamentos (e exemplos) que nos deixou o maior de todos foi que não é preciso corromper-se para alcançar o poder. Onde houver um ser honesto e justo falando, verdadeiramente, em favor da humanidade como um todo, haverá um grupo de honestos e justos para aplaudi-lo e impulsioná-lo ao verdadeiro poder!

Obrigada por ser meu pai. Obrigada por tudo o que me ensinou e me proporcionou viver pois, sem você, eu hoje não poderia escrever este texto...

By Lou de Olivier - 23/07/2007 antecipando o dia dos pais...

Lou de Olivier - Psicopedagoga, Multiterapeuta, Dramaturga, Escritora

Site oficial: www.loudeolivier.com.br

Lou de Olivier
Enviado por Lou de Olivier em 03/08/2007
Reeditado em 27/10/2010
Código do texto: T591625
Classificação de conteúdo: seguro
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