Embaixador Paulo “Pavão Velu” Miranda
Entre as pessoas com quem tenho convivido nesta vida está o Paulo Wangner de Miranda, o Pavão do Ginásio, o Paulo do Luiz Velu do “Beco-Sem-Saída”, mais tarde Embaixador Paulo Miranda.
Conheci-o quando tínhamos uns 8 ou 9 anos de idade, logo quando sua família mudou para Pitangui, vinda das “longínquas” paragens do Brumado.
Nessa época, ele e os irmãos, César e Zé Luís, passavam de bicicleta pelo Beco dos Canudos e paravam por instantes em frente à casa do meu pai. Renato “Bhá” era um pirralhinho que não andava ainda no mundo. No nosso alpendre, constantemente cheio de crianças, sempre havia uma novidade ou, pelo menos, um jogo de bola, um brincadeira ou novidade qualquer que fazia sempre ajuntar mais e mais curiosos. Calados, os Miranda observavam e iam embora. Sempre tinham obrigações e não se demoravam.
Nosso conhecimento de verdade, porém, só começou quando estudamos juntos no Ginásio, quando repeti a quarta série ginasial. Usei desse estratagema para não ir morar em Belo Horizonte dos 14 para 15 anos de idade. Na época, a capital era um longínquo território, separado de Pitangui pela poeira até o Pará de Minas, pelo empedrado até Juatuba e pelo asfalto até a Feira de Amostras, coração da Belo Horizonte de então. Inventei uma “bomba”, e meu pai desinventou a mudança para a casa de meus tios na Cidade Jardim e uma matrícula no Colégio Estadual do Santo Antônio, onde iriam preparar-me para cursar Engenharia.
Quem sabe daria certo, tudo é possível. Essa mudança, no entanto, só aconteceu quando eu mesmo tomei tenência e resolvi fazer faculdade e sair da barra da saia da mãe, das calças do pai e dos grilhões de algumas desilusões amorosas de adolescente, três anos depois.
Esse evento fez com que nós dois passássemos a estudar na mesma sala no GENEP, sigla para Ginásio e Escola Normal Estadual de Pitangui. Daí começa uma amizade que nunca mais terminou. Em 1966, ele foi para o seminário em Divinópolis e eu continuei em Pitangui, estudando à noite na Escola de Comércio. Iniciamos uma correspondência intensa, onde misturávamos os idiomas que íamos aprendendo, antecipando essa internacionalidade que realmente iria acontecer.
Quando terminamos o segundo grau, ele em Divnópolis, eu em Pitangui, foi a hora de decidir por faculdade. Decidimos juntos e fizemos o vestibular na UFMG para Letras. Eu segui Português e ele, Inglês. No decorrer do curso, nos matriculávamos em toda língua que aparecia no currículo de matérias optativas da faculdade, e o conhecimento se consolidava. Italiano e Alemão se incluíram nos nossos currículos.
Terminada a faculdade, ainda fiquei dois anos em Belo Horizonte, trabalhando como professor, mas com sentido no concurso do Itamaraty para Oficial de Chancelaria. Fiz em 1974, passei e, um ano, depois, em 1975, ia para meu primeiro posto no exterior: Jeddah, Arábia Saudita. Algum tempo depois, o Paulo passou no concurso para diplomata e seu primeiro posto foi Djakarta, Indonésia.
Essa amizade, cimentada por esses interesses comuns, foi mantida, apesar dos longos intervalos e distâncias. É que os “meninos” de Pitangui, dos becos “Canudos” e “Sem-Saída”, filhos do Dininho e Luiz Velu, moraram em lugares tão diferentes como Arábia Saudita, Indonésia,Singapura, Polônia, Haiti, Nigéria, Dinamarca, Paraguai e Inglaterra, entre outros menos votados.
Hoje, nosso ponto de encontro é na literatura, no site “Recanto das Letras” e na informalidade do fabuloso grupo de watzapp “Pitangui Sempre Amigo”, já que um trabalha em Brasília e o outro em Belo Horizonte. No grupo, ele posta suas crônicas de resgate de pessoas, fatos e lugares de Pitangui e Brumado, principalmente, mas também dos idos e vividos de Belo Horizonte, Divinópolis e daqueles tantos lugares do mundo. Uma deliciosa viagem pelos desvãos do passado.
Cada dia mais me encantam suas qualidades de escritor, num estilo que foge a qualquer classificação. Seu conhecimento não só do português, mas também de outros idiomas, como latim, espanhol, italiano, inglês, alemão e francês, faz com que seu jogo de palavras não tenha fim. Suas brincadeiras semânticas e intertextuais migram de uma língua a outra, produzindo ironia, humor refinado e, também, melancolia diluída, que me fazem rir e meditar a cada vez que leio um de seus textos que produz a carradas.
E a amizade? Continua. É para sempre, já não precisa de muita explicação, é muita estrada parecida, percorrida e digerida. Um abraço a esse amigo, irmão de caminhada.
(Abuja, Nigéria, out/2016)