Três textos-homenagem
MEU AMIGO DORME
POEMA ESCRITO EM 1987
Meu amigo dorme
na noite pura.
Animaizinhos nascendo na floresta
flores de lótus abrindo-se em silêncio
seio materno
brancura
Via Láctea
estrelas de matizes delicados.
Meu amigo dorme.
Desde sonho não sei
mais que um tremor levíssimo de pálpebras.
Sinto a noite se abrindo devagar
e o canto dos mundos indizíveis
acalentando a criança pequenina
flor toda aberta ao pólen das estrelas.
E enquanto dorme
o mundo silencia
seus cânticos de guerra
suas horas pesadas
as árvores sangrando
os pássaros funestos
as palavras que não sabem mais nada
do mundo
de si mesmas.
Meu amigo dorme
e enquanto dorme
sua vida se abre
a um relógio sem pêndulo.
As palavras são cores
as estrelas, ponteiros
por onde flui seu pensamento.
E eu, toda nova
dessa música que brilha
em seus cabelos
- fruto maduro ainda úmido
do parto das estrelas -
fecho também os olhos
e ao útero da noite
confio as minhas asas.
Do livro "ESPELHOS EM FUGA", Editora Objetiva, 1989.
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O Protagonista
O
BICO
DE UM SEIO
CRESCENDO NA TELA
NÃO SABE QUE ESTE BICO DE SEIO
ESTÁ SENDO O PROTAGONISTA DE UM ARTISTA
A PINTÁ-LO ENQUANTO REPOUSA O PRÓPRIO SEXO
MOLHADO ENTRE OS LENÇÓIS NA CAMA DO HOTEL
Escrito por volta de 1998
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A TRIGÉSIMA MULHER
Poema escrito em 2011
a morte
em cada xícara
a face sem face
da trigésima mulher
árvore ave canção
sussurro das coisas mortas
em vão
a trigésima mulher
a derradeira
estrelas que estalam
noite que se quebra
cai
fragmentos
de nós
a dançar
ao redor de nós
ao redor de nós
as palavras sonhadas
as palavras sagradas
a morte que te quer
esta rival
teu grito
em mim
meu grito
em ti
os tempos de nós
que tento segurar
as xícaras
a porcelana da tarde
a tarde
vaso a se partir
o meu amor
partido
em ti
em ti
em mim
cacos de nós
primeiro homem trigésima mulher
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