Homenagem póstuma a Thereza Cardoso Rocha

Mãezinha querida:

Por alguns dias, a paisagem passava pela janela do trem que te traria a Curitiba, num balanço e barulho cadenciados e persistentes. Às noites, as estrelas que contrastavam com aquele céu azul, iluminavam teu coração, indicando o rumo de tua nova e aguardada missão. Para cumprí-la, deixavas para trás entes queridos, de uma família grande, unida e de coração apertado com tua partida. Não sabias qual seria a possibilidade de comunicação com os teus. Dirigia-te a um novo mundo, desconhecido, amparada por Deus e por teu amado parceiro.

Então aqui chegaste. Mulher cheia de viço, inteligência e atitudes, abafavas tua saudade em labor, distribuindo amor, simpatia e ajuda. Tua entrega, total e sem distinção, mudaria a vida de tantos quantos tiveram a ventura de cruzar contigo os seus próprios caminhos. Mudaste pessoas e ambientes. Lugares por onde passaste jamais seriam os mesmos.

Deste-nos a vida. Uma vida abençoada e intensa. Carregada de emoção, amor, alegria, coragem, aprendizagem e liberdade, em cujas asas voávamos, sempre em festa, em tua própria direção, nosso primeiro e último refúgio de calor, segurança e referência.

Agora descobrimos que não conseguimos assimilar todas as tuas lições. Perdoe-nos. Não somos capazes de testemunhar e suportar teu sofrimento. Ao lado de teu leito, onde aparelhos profanos que, sem respeito ao teu corpo, já frágil, franzino e indefeso, sem consideração à tua história e existência, teimando em apenas medir tua lenta agonia, em sofrimento mudo e isolado, as pernas amolecem, os corações sangram e transbordam, compulsivos, pelas nossas faces, sem qualquer controle. Que doloroso contraste. Que dolorosa impotência. Ainda assim, tu, guerreira teimosa, nessas escassas oportunidades e condições, tentas acalmar nossos corações, pelo movimento de sobrancelhas, assegurando-nos da tua ciência de nossa presença e carinho. Certamente, de nosso desespero, também.

Tu te foste.

Chegamos ao doloroso momento de devolver-te a Deus. Quem se atreveria a questionar Sua vontade, se a Ele pertences e apenas por Sua graça a tivemos? No entanto, agradecidos e agraciados com o presente de tua própria vida, rogamos que a tamanha dor de tua falta represente a Deus a dimensão de teu legado. Que a grandeza de nosso sofrimento e adoração sejam créditos a teu favor na forma de reconhecimento, paz e descanso.

Nosso verão não teria mais a mesma cor, calor e alegria, não fosse a imagem congelada do brilho de teu olhar, luz que nos guia. Não fosse o encanto de teu sorriso a certeza de que a vida, bem vivida, em paz e em doação, é tudo o que vale a pena.

“... as estrelas, que contrastam com esse céu azul, iluminam teu coração, indicando o rumo de tua nova e aguardada missão. Para cumpri-la, deixas para trás entes queridos, de uma família grande, unida e de coração apertado com tua partida. Não sabes qual será a possibilidade de comunicação com os teus. Dirige-te a um novo mundo, desconhecido, amparada por Deus e por teu amado parceiro ...”

Esse texto foi escrito na 2ª pessoa, em homenagem à nossa gaúcha mais querida.