ADEUS, FILHO DA TERRA

Vi o terror meio escondido por uma máscara onde se misturava timidez, saudade latente, amor à vida. Ele tinha apenas um pouco mais de quarenta anos. Cabeça sem cabelos resultado do tratamento que fazia.

No principio foi apena suma espinha. Reclamava, mas ninguém lhe dava atenção. Numa noite viu o dia clarear, e sozinho procurou atendimento médico. Os remédios aceleraram o calvário que iria passar.

Quatro filhos pequenos. Vivia da agricultura e pecuária. Recebia ajuda dos pais para sobreviver num mundo longe de tudo e onde falta tudo. Onde a natureza é mais forte, e subjuga homem, animais, vegetação. Filho obediente, irmão zeloso, pai de família admirado pelos filhos e pela esposa. Um irmão se dispôs a cuidar dele. As pessoas não suportavam olhar para seu rosto disforme pela doença traiçoeira e cruel.

Foi para a capital, e os médicos mandou pra casa para morrer. Mas, a vida tem maneira de escrever uma história diferente do que está no script. Quem faleceu foi o irmão que cuidava do desenganado com tanto desvelo . Um derrame cerebral ceifou a vida de um jovem que tinha tantos sonhos e que havia feito tantas promessas de que não sabia, jamais poderia cumprir.

O doente cambaleou, curvou-se igual à palmeira, mas se ergueu e continuou o tratamento. Os médicos não acreditaram no que viam. O rosto voltou ao normal. Um olho que estava esbugalhado e deslocado para perto da orelha esquerda voltou ao seu local de origem. Ele já não escondia o rosto, e por vezes sorria.

Mas, precisava continuar o tratamento. Doze horas de viagem. Casa de apoio em Recife cheia com tantos enfermos. Cada quadro pior do que outro. Ele saía no horário para receber a quimioterapia e voltava no horário de costume. Ninguém desconfiava de nada. Ele foi ficando calado, afastado de todos.

Descobriram que nessas saídas nunca havia entrado para dar continuidade ao tratamento. Havia desistido de tudo. Como havíamos clamado aos céus! Mas, Ele era de lá. Chegou o tempo. Amanhã (sábado )descerá à sepultura. Pra quem viu a dor dos pais e restante da família resta tirar alguns lições:

1 – É preciso preparação, porque quando chega a hora, vai o moço, o velho, vai à criança. Há pessoas que não se preocupam com a eternidade, mas ela é uma realidade e todos terão que realizar essa viagem.

2- Compartilhemos os momentos bons, mas também os maus. Amanhã poderá ser eu. Poderá ser você a passar por isso.

3- Devemos cuidar do nosso passaporte espiritual. Sem ele não poderemos adentrar pelos portões celestiais.

4- Enquanto tivermos com vida, devemos utilizar o tempo com sabedoria e dando bons frutos.

5- E por citar a amiga sabedoria, devemos buscá-la com insistência, pois Deus concede a todos em abundância.

Mais uma família enlutada, mas um ciclo que é quebrado, pois o natural é que os filhos enterrem os pais e não o contrário. Mais um momento que compareço, e volto destroçada.

Ione Sak 30/01/16

Ione Sak
Enviado por Ione Sak em 30/01/2016
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