Tributo a Ricardo Reis
Vem sentar-te comigo, Lídia, à beira do rio.
Sossegadamente fitemos o seu curso e aprendamos
Que a vida passa, e não estamos de mãos enlaçadas.
(Enlacemos as mãos.)
Ricardo Reis, in "Odes"
Heterónimo de Fernando Pessoa
Recorda comigo Irene, vê o rio passar!
Demos as mãos, realizemos, o fim a que nos levaram,
Os passos, decisões inalteráveis que um dia demos,
Seguem bem longe na foz, as palavras que buscas,
Confirmadas por Deus!
Seguimos como corrente descendente lado a lado,
Sem que cansados estejamos, nas correntes do prazer,
A vida segue, sedenta de cobranças, no nada,
Na vida que temos.
Seguimos, nos amores, confrontos, seduções,
Guerras, paz, longe, perto, juntos, afastados,
Mas seguimos sempre, na mesma corrente,
Rio que corre até à foz.
Olha a natureza, animais divertidos, astutos,
Nos longos rituais de escolha, sedução,
Onde nada importa, tudo se resume num ato,
Amemos com nossos corpos!
Se ao menos um dia me recordares, sem sombra,
Na imagem terna, inocência de uma criança,
Sorriso nos lábios, um brilho no olhar,
Calor das mãos enlaçadas!
E se antes de o barqueiro do rio me passar,
Eu de ti me recordar, nada sofrerei ao me lembrar,
De ti comigo sentada a ver o rio passar,
De mãos enlaçadas a olhar!
Alberto Cuddel
Poema de tributo a um dos heterónimos do autor que mais me impulsiona a escrever!