Adeus, Jonba, adeus Recantista
Jonba, adeus, Recantista
Difícil resumir o Jonba, João Batista de Freitas, em uma só palavra, uma profissão, um hobby, um temperamento. Patologista, poeta, músico, elaborador de temperos, cozinheiro, contador de causos, advogado, político de passagem, marceneiro artístico, orquidófilo, agitador cultural, líder estudantil, anfitrião de primeira... Y otras cositas más. Melhor chamá-lo meu irmão que, para mim, resume tudo. Meu irmão espiritual e literário. E tão diferentes quanto os irmãos podem ser e, quase sempre, são, nós fomos. Mas isso não impediu uma amizade de quase cinquenta anos.
Saí pelo mundo, começando de Beagá, indo para Brasília, para a Arábia Saudita, Dinamarca, Brasília de novo, Pitangui, Brasília, Paraguai, Brasília de novo, uma ciranda interminável. Pelo menos até agora.
Por seu lado, ele saiu de Pitangui para Beagá, depois para Trombetas, no Pará, e voltou a Pitangui em 1984, com intenções de reatar os laços com o torrão natal. Nunca mais se mudou de Pitangui e poucas vezes se ausentava. Logo em seguida, em 1985, este andarilho que vos escreve também voltou à terra natal, planejando permanecer para sempre. Daí, era começar a transformar as experiências vividas em linguagem de poesia e música, cujo vértice era o Reinaldo Rohr, o Reinaldo Pereira de Souza, nosso músico permanente, com quem eu já tinha feito algumas músicas. Algum tempo depois, se ajuntava ao trio o jovem Ricardo Nazar, formando um quarteto que continuou a compor sempre que mais de um se encontrava em Pitangui.
Jonba dividiu comigo um monte de iniciativas: criamos o Pitaculta, Movimento Pitanguiense de Ação Cultural, em 85; fundamos o PSDB (foi mal, desculpem, que arrependimento entrar na política partidária!), em 1988; apoiou o quanto pôde o jornal Correio de Pitanguy, escrevendo, entre outras coisas, a série de "causos", o "Beira de Balcão". Certa época, começo dos anos 90, confessou-me que estava exagerando no álcool. Conversamos, incentivei-o a controlar-se, ele não quis apenas controlar-se: parou de vez. Tinha sempre uma cachacinha em casa para os amigos, mas nunca mais tomou bebida alcoólica.
Um dia de maio, me ligam dizendo que ele só tinha três meses de vida, padecia de fibrose pulmonar. Não acreditei ou não quis acreditar. Passei a ligar mais vezes para acompanha-lo. A cada conversa, ele se mostrava positivo e confiante, fazendo planos, tanto em nível pessoal e familiar, quanto no que tinha a ver com nossa produção musical, que estávamos agrupando no You Tube.
Nas férias de julho, estive uma semana em Pitangui. Prosseguimos as conversas sobre projetos anteriores, um deles a de escrever a quatro mãos as histórias de cada casa e cada morador que viveu no trecho do Largo da Santa Casa, passando pela igreja de São Francisco até chegar à Gameleira, seu caminho de todo dia. Temendo, mas ainda não querendo acreditar que sua situação fosse tão grave, insisti para que organizasse seus escritos para publicar no Recanto das Letras. Ele poderia ser mais um Recantista, e de primeira qualidade, já que não poderia mais trabalhar na marcenaria nem cuidar de suas orquídeas. Precisava ocupar o tempo uma pessoa que sempre fora tão ativa.
Aceitou, começou a publicar, mas já não deu tempo. Publicou apenas dois poemas, que podem ser lidos nos links:
http://www.recantodasletras.com.br/poesiasbucolicas/5350603 e http://www.recantodasletras.com.br/poesias/5320638.
No entanto, pelo menos, muitas de suas letras, em composições conjuntas com Reinaldo Rohr, Ricardo Nazar e comigo, podem ser encontradas no Youtube, no link:
https://www.youtube.com/user/reinaldorohr
Adeus, Recantista, adeus, amigão. Cada dia sei menos da vida e menos ainda da morte, mas, no fundo, no fundo, espero encontra-lo em outra dimensão para conversarmos sobre tudo e nada e publicarmos seus poemas, verdadeiras obras de arte e de conhecimento existencial. Afinal de contas, ficou muita coisa boa para trás, muita coisa bonita que o mundo merece conhecer.